Ezequiel, o “vale de ossos secos” e o “estilo literário” de Deus

Ezequiel foi profeta durante o exílio babilônico, um período crítico da história do povo de Israel.

Nessa época, o reino de Judá havia sido conquistado pelos babilônios, e muitos de seus habitantes, incluindo a elite e os líderes, foram deportados para a Babilônia — incluindo Ezequiel, que começou seu ministério no quinto ano do exílio do rei Joaquim (por volta de 593 a.C.).

Seu chamado profético foi marcado por visões extraordinárias, que incluíam seres celestiais, carruagens divinas e o trono do próprio Deus.

Ele alertou sobre uma iminente destruição de Jerusalém e do seu Templo, bradou contra a idolatria, a injustiça social, a infidelidade e a rebeldia do seu povo.

Suas visões catastróficas se estenderam às nações vizinhas: Amom, Moabe, Edom, Filisteia, Tiro, Sidom e Egito também enfrentariam catástrofes.

No entanto, ele também profetizou a restauração futura de Israel e a reconstrução do Templo.

Essa última profecia veio através de uma visão que, embora seja carregada de esperança, não deixa de ser assustadora.

E, aqui, eu gostaria de elogiar o “estilo literário” de Deus.

Vejam como Deus se comunica de uma forma extraordinária:

Ezequiel é levado pelo Espírito do Senhor a um vale de ossos secos.

Deus pergunta a Ezequiel se esses ossos “poderão tornar a viver” (Ezequiel 37:3) e, então, ordena que Ezequiel profetize para eles sua restauração.

Enquanto Ezequiel o fazia, os ossos começavam a se mexer e a se juntar ordenadamente. Depois de se juntarem, tendões e carne começavam a aparecer sobre os ossos e, por fim, a pele.

Imagine que um vale de ossos se transformava num vale de corpos inanimados.

Deus, então, ordena que Ezequiel profetize ao “sopro de vida”, para que ele entre nos corpos. Quando Ezequiel obedece, os corpos se levantam.

Muito se fala da linguagem críptica de Deus, do porquê de suas mensagens não serem mais “claras” ou apelarem apenas para verbos, sujeitos e predicados — o porquê do espetáculo de ossos se tornando carne?

Acredito que essa pergunta beira a insolência: se não questionamos Shakespeare sobre a pertinência de suas metáforas ou a Poe sobre os efeitos pretendidos do corvo que pousa no busto de Pallas, por que teríamos que exigir do Senhor dos poetas a pobreza da mensagem direta?

Deixemos Deus com sua poesia profética sobre redenção, feita de ossos e carne.

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