O conceito de “garota final” nos filmes de terror e o que ele diz sobre nossa cultura

Já ouviram  falar do termo “final girl”? Trata-se de um tropo comum em filmes de terror, principalmente slasher. Ele refere-se literalmente à “última mulher viva” que sobrevive para contar a história. É uma figura tão presente que quase se projeta num arquétipo típico do gênero. Percebemos ela em filmes como Psicose, Vozes do Desejo, O Massacre da Serra Elétrica, Halloween, Alien, Sexta-Feira 13, A Hora do Pesadelo e Pânico.

O termo foi cunhado por Carol J. Clover em seu artigo “Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film” (1987).
Neste artigo, Clover nota que os slashers costumam obedecer a uma regra (até mesmo inconsciente) em sua estrutura, em que a primeira metade do filme geralmente é mais próxima do assassino enquanto na segunda metade a identificação muda para a “garota final”.

O significado original de “final girl”, conforme descrito por Clover em 1987, é bastante restrito e implica em inúmeras características interessantes que até mesmo sugerem um subtexto moral (que, mais uma vez, chega a ser inconsciente). A “final girl” possui normalmente uma superioridade moral implícita de um ponto de vista cristão: ela normalmente está sóbria, recusa-se a usar drogas, busca uma relação estável e não é tão aberta sexualmente quanto seus amigos.

Em determinados momentos, a “final girl” parece ser até mesmo uma figura abençoada por Deus, pois são inúmeros os caminhos do roteiro que a favorece.

Segundo Carol J. Clover, ao mesmo tempo que o tropo da “garota final” afirma todos os valores cristãos, ela também é considerada uma espécie de subproduto feminista, pois subverte completamente o papel de “donzela em perigo” e são garotas que, normalmente, se valem de engenhosidade e coragem para enfrentar seus antagonistas de uma maneira heroica e até mesmo épica.

Essa ambiguidade, acredito eu, é uma típica idealização protestante puritana que separa essencialmente a figura da “santa” e a figura da “amazona” na radicalização da éfige europeia da “donzela no castelo esperando o cavaleiro”. Uma radicalização que ignora a figura de Santa Joana D’Arc na idealização convergente de pureza e bravura.

De qualquer forma, é sempre interessante notar o quanto desses modelos transbordam no imaginário coletivo e ate mesmo nos filmes B sem pretensão intelectual alguma.

 

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O podcast é apresentado por Gabriel Vince. Já foi estudante de filosofia, história, programação e jornalismo. Católico, latino e fã de Iron Maiden. Não dá pra ser mais aleatório que isso.

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