O Purusasukta é um antigo hino sânscrito encontrado no Rigveda, um dos textos sagrados mais antigos da tradição védica na Índia. Este hino é particularmente notável por sua descrição da criação do universo e da humanidade.
No Purusasukta, o deus primordial Purusha (ou Puruṣa) é retratado como uma entidade cósmica que se sacrifica para criar o mundo. O hino descreve como o corpo de Purusha é dividido para formar os diferentes elementos do cosmos, incluindo os quatro varnas (classes sociais) da sociedade védica, além de diversos aspectos da natureza e do universo.
Outro deus importante na tradição cosmogônica, também associado à origem do universo, é Prajapati. Ele é geralmente traduzido como “Senhor dos Seres” ou “Senhor da Criação” e refere-se a uma deidade primordial vinculada à criação e à proteção do universo.
Na tradição védica e em textos posteriores, Prajapati é frequentemente descrito como o criador dos seres humanos e de outros seres vivos. Ele é associado ao início da criação e muitas vezes é visto como uma figura que organiza e dá forma ao cosmos.
Prajapati parece ser uma construção da especulação erudita. Ele é descrito como a “unidade-totalidade não manifestada”, como aponta Mircea Eliade, uma presença puramente espiritual. Contudo, o desejo (kāma) o incitou a multiplicar-se e reproduzir-se. Ele se “aquecia” a um grau extremo através da ascese (tapas, literalmente “calor, ardor”) e criou por “emanação”.
Quando Prajapati concluiu sua criação, ele refletiu sobre o fato de ter criado uma “réplica de si mesmo” (Rigveda, XI, 1, 6, 1s), sugerindo que, assim como antes ele era “unidade-totalidade”, agora ele se tornava “criador-criatura”. A ideia é que, se tudo veio dele, tudo está nele e, portanto, tudo é ele também. Isso pode ser interpretado como uma forma de panteísmo. Outra ideia, uma variação do panteísmo, sugere que Prajapati se consome ao criar. Nesse caso, no final da criação, Prajapati se desfaz como criador no ato de criar, deixando de existir(!) e restando apenas a criação. Os dois termos-chave identificados por Eliade são “tapas” (calor ascético) e “visṛj” (emissão dispersa) – ou seja, o ato de criação é visto como um ato de combustão ou “queima calórica”.
Assim como no Purusasukta, Prajapati também “morre” para criar. A ideia de separação, diferenciação, discriminação, corte e sacrifício é comum nas cosmogonias. Os deuses frequentemente despedaçam algum gigante ou monstro marinho, ou separaram a terra do céu, a luz da escuridão, ou as águas inferiores das superiores (Gênesis 1:6-9).
Mircea Eliade argumenta que o mito e suas imagens traduzem a cosmogonia em termos físicos e biológicos e que é interessante notar essas correspondências na divisão celular. Pessoalmente, discordo, acreditando que a biologia (e toda a ciência humana) é, na verdade, uma cópia das especulações teológicas de antigos místicos. Não é à toa que nossa ideia de “zygōtos” é emprestada da cosmogonia grega.