Za ginipiggu 6: Peter no Akuma no Joi-San
Hajime Tabe
1990
Sou altamente estimulado pelo bizarro e não consigo desconsiderar o fato de o filme ser uma peça surpreendentemente imprevisível de splatter comedy.
★★★★★ 3/5
Taverna do Lugar Nenhum » Filmes » Franquias » Guinea Pig
No universo das locadoras de filmes em VHS, entre os anos 80 e o final dos anos 90, havia uma área misteriosa, geralmente localizada no fundo dos estabelecimentos. Essa seção era sinalizada com avisos imperativos e vigiada atentamente pelos funcionários.
Estou falando da área restrita a menores de 18 anos.
Sempre havia aqueles que, aproveitando-se da distração dos adultos, se esgueiravam para essas zonas proibidas. Todos sabiam que ali estavam os “filmes proibidos” — algo naturalmente atraente para os adolescentes.
No entanto, havia também outros fatores que levavam até mesmo crianças a se aventurarem nesse território. A curiosidade e o senso de desafio, mais ligados ao prazer de transgredir do que à luxúria, eram estimulados pelas normas de restrição explícita.
Essas restrições, tão enfáticas, mitologizavam as áreas mais proibidas das locadoras. As portas fechadas e até mesmo os avisos, que se assemelhavam a selos sagrados ou a um portal, evocavam imagens que Mircea Eliade poderia interpretar como proto-religiosas.
Obviamente, isso não passa de uma interpretação simbólica. O que essas portas guardavam, na verdade, era o lado mais animalesco da arte. No entanto, nossa memória religiosa age contra nossa vontade e distorce facilmente diante de falsos padrões.
Guinea Pig, uma obra idealizada por Satoru Ogura, é um tipo de filme de horror tão extremo que foi banido não apenas das áreas restritas, mas das próprias locadoras.
São seis filmes no total: Devil’s Experiment (1985), Flower of Flesh and Blood (1985), He Never Dies (1986), a obra-prima Mermaid in a Manhole (1988), Android of Notre Dame (1988) e Devil Woman Doctor (1990) — cada um com seu universo próprio, sem regularidade ou estética pré-estabelecida.
Apesar das proibições, que envolveram até o FBI, os filmes fizeram bastante sucesso e circularam muito. Eu diria que, se não fossem proibidos, o impacto e a circulação desses filmes provavelmente seriam menores.
Guinea Pig pode ser analisado sob a ótica do conceito que Richard Sennett chama de “tirania da intimidade”.
No espaço público, ele argumenta, é necessário aprender a arte da contenção das emoções, do silêncio e da discrição, que prevalecem como regras de conduta e civilidade.
Assim, à crescente segmentação e fragmentação da esfera pública, corresponde um investimento cada vez maior no espaço íntimo e privado, vistos como refúgios necessários para escapar do ambiente coercitivo e castrador da cidade.
O retorno simbólico ao conforto e à segurança do útero implica, segundo Sennett, um “retraimento emocional em relação à sociedade”. Esse retraimento autoriza um voyeurismo impensável no espaço público, onde o gozo, mesmo o mais contido, deve ser sublimado em nome do decoro e da moralidade comuns, mas pode ser exercido sem restrições no espaço confinado da intimidade.
É nesse espaço íntimo que o consumo do proibido e do impróprio ocorre, onde o ato de transgressão se torna uma válvula de escape para um prazer narcísico, secreto e perverso.
Os filmes da série Guinea Pig são caseiros, e não poderiam ser de outra forma. Não são cinema no sentido tradicional — como normalmente pensamos. São filmes feitos para o consumo privado, não para exibição pública em salas de cinema — e não se colocam nesse lugar apenas pela violência extrema.
Não se trata de filmes com cenas gore, mas de filmes que abordam a violência com uma abordagem quase pornográfica.
O primeiro filme da série, Devil’s Experiment, por exemplo, pouco ou nada desenvolve personagens ou narrativa. O filme, que não é nem de longe o melhor da série, retrata um grupo de três homens que abusam de uma mulher de várias maneiras. Sim, o filme é basicamente isso.
Com um estilo próximo ao found footage, o filme se apresenta como uma “filmagem real de tortura” — supostamente destinada a um experimento sobre a tolerância à dor e à humilhação.
Não preciso dizer que as cenas de violência apresentadas no filme não são autênticas (ou seja, é um falso snuff movie) e que o filme utiliza extensivamente efeitos práticos.
A linha que separa o deplorável do ousado é difícil de determinar neste filme. Ele é sádico na mais exata definição do termo. Aqui, a violência brutal e gratuita se associa a uma certa dose não assumida e subterrânea de erotismo.
No entanto, pouco importa o filme.
Esse tipo de obra causa impacto, e percebi isso no momento em que assisti.
As cenas de tortura me incomodavam. A proposta me era indigesta. Cheguei a questionar os limites da minha tolerância artística. Questionei, inclusive, se deveria ter alguma tolerância artística. Também me perguntei sobre os meus valores ao não reprimir com veemência aquilo que via. Minha vontade era protestar contra aquela aberração sem sentido e recomendar o ostracismo para aquela obra.
O nojo e a indignação cresciam em proporção à minha necessidade de controle. “Alguém tinha que censurar aquilo”, pensava eu.
Nesse momento, me achei patético, pois percebi que era apenas um filme. Todos os atores haviam consentido. Ao assistir o documentário sobre os filmes, via que, entre uma tomada e outra, todos estavam rindo e se divertindo — e provavelmente ririam ainda mais se pudessem ver meu olhar de reprovação.
Quem eu queria defender? O que eu estava defendendo? O filme não tinha uma tese. Não defendia ideologia alguma que eu pudesse usar como base para uma crítica.
O problema era eu: a minha sensibilidade estética ao sublime se tornou indistinguível de uma afetação politicamente correta.
Foi aqui que percebi o quanto me afastei daquela pessoa que frequentava livremente os cineclubes da minha cidade (presencialmente) e se permitia ser exposta a todo tipo de experiência estética, até aquelas que causavam mal-estar. Esse acúmulo de experiências me formou.
Talvez olhar melhor para uma catedral gótica francesa, que combina o sublime dos vitrais e a feiura proposital dos gárgulas, fosse a chave para o mergulho estético de que necessitava — de alguma forma, o grotesco precisa ter um lugar em nosso mundo.
A minha intenção era fazer o review do primeiro disco do Yellow Magic Orchestra e, ao ler sobre o disco, acabei fazendo um artigo sobre a conexão entre Hip Hop, Video Games e Xintoísmo.
Saiu melhor do que eu imaginava.
https://tavernadolugarnenhum.com.br/resenha/yellow-magic-orchestra/
Maio 16
A minha intenção era fazer o review do primeiro disco do Yellow Magic Orchestra e, ao ler sobre o disco, acabei fazendo um artigo sobre a conexão entre Hip Hop, Video Games e Xintoísmo.
Saiu melhor do que eu imaginava.
https://tavernadolugarnenhum.com.br/resenha/yellow-magic-orchestra/
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Porto ...
The Apparition segue sendo minha obra favorita de Gustave Moreau e a música que eu menos gosto do Iron Maiden
Maio 14
The Apparition segue sendo minha obra favorita de Gustave Moreau e a música que eu menos gosto do Iron Maiden ...
Eu não estou nem ai para o mapa invertido do IBGE.
Um mapa que ignora as serpentes marinha, o Kraken, a Hydra, a Ceto primordial, o Jormungand nos mares nórdicos, o Leviatã, a Lusca caribenha que arrasta pescadores para o abismo, as bestas gaélicas que açoitam as costas da Irlanda, os monstros africanos que espreitam nos rios do Congo, as criaturas asiáticas que habitam os mitos de Yokohama, os grandes cetáceos dos contos inuit, as sereias traiçoeiras dos cais abandonados, o Makara, o Umibōzu no mar do Japão, o Bakunawa filipino que devora a lua, o Akkorokamui das lendas ainu, o Morgawr, o Hippocampo, o Nuckelavee, Tiamat, Zaratan e até o temido Qalupalik — é um mapa que NÃO VALE NADA.
Em suma, não é o mapa do IBGE que está invertido — o mundo atual inteiro é que é um mundo invertido. O mapa do IBGE não passa de uma paródia involuntária e redundante.
Maio 13
Eu não estou nem ai para o mapa invertido do IBGE.
Um mapa que ignora as serpentes marinha, o Kraken, a Hydra, a Ceto primordial, o Jormungand nos mares nórdicos, o Leviatã, a Lusca caribenha que arrasta pescadores para o abismo, as bestas gaélicas que açoitam as costas da Irlanda, os monstros africanos que espreitam nos rios do Congo, as criaturas asiáticas que habitam os mitos de Yokohama, os grandes cetáceos dos contos inuit, as sereias traiçoeiras dos cais abandonados, o Makara, o Umibōzu no mar do Japão, o Bakunawa filipino que devora a lua, o Akkorokamui das lendas ainu, o Morgawr, o Hippocampo, o Nuckelavee, Tiamat, Zaratan e até o temido Qalupalik — é um mapa que NÃO VALE NADA.
Em suma, não é o mapa do IBGE que está invertido — o mundo atual inteiro é que é um mundo invertido. O mapa do IBGE não passa de uma paródia involuntária e redundante.
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Nüwa (女娲) reparando o pilar do céu derrubado por Huangdi (黃帝).
Um macete que aprendi com o tio Eliade: quando uma entidade aparece realizando tarefas mecânicas — como carregar pedras, construir ou reparar coisas —, geralmente estamos diante de uma figura inserida numa epopeia heroica. Trata-se, em muitos casos, de um demiurgo civilizador de traços prometeicos ou de um homem primordial (como Adão).
Essas entidades, curiosamente, costumam ser as mesmas que criam a humanidade. Nüwa, por exemplo, assim como Prometeu, moldou os seres humanos individualmente em argila. A lenda diz que ela usou argila amarela para formar os nobres e ricos, e lama marrom para os pobres e plebeus.
Maio 13
Nüwa (女娲) reparando o pilar do céu derrubado por Huangdi (黃帝).
Um macete que aprendi com o tio Eliade: quando uma entidade aparece realizando tarefas mecânicas — como carregar pedras, construir ou reparar coisas —, geralmente estamos diante de uma figura inserida numa epopeia heroica. Trata-se, em muitos casos, de um demiurgo civilizador de traços prometeicos ou de um homem primordial (como Adão).
Essas entidades, curiosamente, costumam ser as mesmas que criam a humanidade. Nüwa, por exemplo, assim como Prometeu, moldou os seres humanos individualmente em argila. A lenda diz que ela usou argila amarela para formar os nobres e ricos, e lama marrom para os pobres e plebeus.
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Esta é a última leva de ensaios, artigos e estudos pessoais publicados nesta grande base de dados de palpites que é o Taverna do Lugar Nenhum.
Se você quiser saber o que acontece com a cabeça de um sujeito que está com hiperfoco em Machado de Assis, Identidade Brasileira, Nouvelle Vague de Hong Kong e Mircea Eliade, essa é a oportunidade.
Aproveite antes que eu fique demente.
Como os mitos de origem e ordenação do mundo na China rimam com os de outras culturas
https://tavernadolugarnenhum.com.br/mircea-eliade/historia-das-crencas-e-das-ideias-religiosas/como-os-mitos-de-origem-e-ordenacao-do-mundo-na-china-rimam-com-os-de-outras-culturas/
Em defesa do Indianismo
https://tavernadolugarnenhum.com.br/sergio-buarque-de-holanda/as-raizes-do-brasil/em-defesa-do-indianismo/
Brasil, Mormaço Colonial e Sinuosidade Lusitana
https://tavernadolugarnenhum.com.br/sergio-buarque-de-holanda/as-raizes-do-brasil/brasil-mormaco-colonial-e-sinuosidade-lusitana/
A Crítica do Humor ao Horror
https://tavernadolugarnenhum.com.br/literatura/literatura-brasileira/machado-de-assis/a-vida-eterna-e-esqueleto-de-machado-de-assis-a-critica-do-humor-ao-horror/
Maio 12
Esta é a última leva de ensaios, artigos e estudos pessoais publicados nesta grande base de dados de palpites que é o Taverna do Lugar Nenhum.
Se você quiser saber o que acontece com a cabeça de um sujeito que está com hiperfoco em Machado de Assis, Identidade Brasileira, Nouvelle Vague de Hong Kong e Mircea Eliade, essa é a oportunidade.
Aproveite antes que eu fique demente.
Como os mitos de origem e ordenação do mundo na China rimam com os de outras culturas
https://tavernadolugarnenhum.com.br/mircea-eliade/historia-das-crencas-e-das-ideias-religiosas/como-os-mitos-de-origem-e-ordenacao-do-mundo-na-china-rimam-com-os-de-outras-culturas/
Em defesa do Indianismo
https://tavernadolugarnenhum.com.br/sergio-buarque-de-holanda/as-raizes-do-brasil/em-defesa-do-indianismo/
Brasil, Mormaço Colonial e Sinuosidade Lusitana
https://tavernadolugarnenhum.com.br/sergio-buarque-de-holanda/as-raizes-do-brasil/brasil-mormaco-colonial-e-sinuosidade-lusitana/
A Crítica do Humor ao Horror
https://tavernadolugarnenhum.com.br/literatura/literatura-brasileira/machado-de-assis/a-vida-eterna-e-esqueleto-de-machado-de-assis-a-critica-do-humor-ao-horror/
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((☀️)) ...
Acabei de ver o filme "Siu Ngo Gong", lançado em 1990.
Trata-se de uma adaptação cinematográfica dirigida por King Hu de um romance wuxia.
A história ocorre em meio às intrigas na dinastia Ming e envolve o roubo de um pergaminho secreto que concede habilidades incríveis a quem o dominar.
Vou falar mais do gênero do que do filme.
O wuxia é exagerado, acrobático e visivelmente mais circense do que marcial. Suas lutas são excessivamente coreografadas e se assemelham mais a um balé do que a um combate.
Pode-se dizer que o wuxia tem mais proximidade com a ópera do que com o cinema. Nas óperas, os exageros — tanto dramáticos quanto cômicos — são elementos distintivos, e o gênero abraça essa herança sem hesitação.
Uma coisa importante a se considerar: o humor autorreferente no wuxia é evidente. Trata-se de uma característica intrínseca do gênero que se repete com notável consistência; em todos, absolutamente TODOS os wuxias isso está presente. O que torna patéticas as tentativas ocidentais de parodiá-lo: como zombar de algo que já ri de si mesmo? Os próprios heróis frequentemente servem como alívio cômico, equilibrando épico e ridículo com naturalidade (e, neste filme, não é diferente).
As lutas, todas maravilhosamente inverossímeis (e engraçadas), não apenas possuem a plasticidade de uma dança, mas também refletem uma cosmovisão espiritual tipicamente chinesa.
Os lutadores não apenas demonstram precisão matemática em cada movimento, como também controlam os ventos, saltam sobre castelos e explodem montanhas com um soco. E, acreditem, nada disso está ligado a "poderes sobrenaturais".
Mircea Eliade descreve como a religião chinesa foi, aos poucos, naturalizando o sobrenatural — a ponto de se tornar, curiosamente, uma expressão de um transcendentalismo imanente.
O que permite a esses guerreiros realizar tais feitos é sempre alguma "técnica ancestral", um conhecimento secreto guardado nas bibliotecas de cidades sagradas. Não à toa, histórias "prometeicas" sobre pergaminhos roubados são comuns no gênero.
Por causa de Eliade, venci tanto boomer que vê "mentirada" em tudo quanto o cinéfilo blasé que não vê nesses filmes nada além do entretenimento exótico.
Maio 11
Acabei de ver o filme "Siu Ngo Gong", lançado em 1990.
Trata-se de uma adaptação cinematográfica dirigida por King Hu de um romance wuxia.
A história ocorre em meio às intrigas na dinastia Ming e envolve o roubo de um pergaminho secreto que concede habilidades incríveis a quem o dominar.
Vou falar mais do gênero do que do filme.
O wuxia é exagerado, acrobático e visivelmente mais circense do que marcial. Suas lutas são excessivamente coreografadas e se assemelham mais a um balé do que a um combate.
Pode-se dizer que o wuxia tem mais proximidade com a ópera do que com o cinema. Nas óperas, os exageros — tanto dramáticos quanto cômicos — são elementos distintivos, e o gênero abraça essa herança sem hesitação.
Uma coisa importante a se considerar: o humor autorreferente no wuxia é evidente. Trata-se de uma característica intrínseca do gênero que se repete com notável consistência; em todos, absolutamente TODOS os wuxias isso está presente. O que torna patéticas as tentativas ocidentais de parodiá-lo: como zombar de algo que já ri de si mesmo? Os próprios heróis frequentemente servem como alívio cômico, equilibrando épico e ridículo com naturalidade (e, neste filme, não é diferente).
As lutas, todas maravilhosamente inverossímeis (e engraçadas), não apenas possuem a plasticidade de uma dança, mas também refletem uma cosmovisão espiritual tipicamente chinesa.
Os lutadores não apenas demonstram precisão matemática em cada movimento, como também controlam os ventos, saltam sobre castelos e explodem montanhas com um soco. E, acreditem, nada disso está ligado a "poderes sobrenaturais".
Mircea Eliade descreve como a religião chinesa foi, aos poucos, naturalizando o sobrenatural — a ponto de se tornar, curiosamente, uma expressão de um transcendentalismo imanente.
O que permite a esses guerreiros realizar tais feitos é sempre alguma "técnica ancestral", um conhecimento secreto guardado nas bibliotecas de cidades sagradas. Não à toa, histórias "prometeicas" sobre pergaminhos roubados são comuns no gênero.
Por causa de Eliade, venci tanto boomer que vê "mentirada" em tudo quanto o cinéfilo blasé que não vê nesses filmes nada além do entretenimento exótico.
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Mesmo que o número de católicos esteja diminuindo, está longe de ser o pior momento. Houve época em que eram centenas, em que eram doze.
Não importa.
Não há como negar a centralidade da Igreja e, em especial, do Papa no mundo — neste aqui, no mundinho material.
A quantidade de gente de outras religiões e até mesmo não religiosos, ou mesmo antirreligiosos, dando palpite sobre o papado é impressionante.
Parafraseando o grande @pergunteaorasta, a Igreja foi fundada, e inúmeros triplex foram inaugurados simultaneamente nas cabeças ao redor do mundo.
Podem discordar se ele é bom, mau, conservador, progressista — só não podem discordar que ele está em um trono.
Em "termos evolianos" (lembram do Evola? Tá meio sumido, o menino), antes de toda e qualquer realidade divina que o justifique, é o único representante cristalino de uma monarquia realmente tradicional — aquela que existe por si só e em que todo o resto orbita.
Toda essa agitação é uma confirmação visível pra mim.
...
"As mariposa quando chega o frio
Fica dando vorta em vorta da lâmpida pra si isquentá
Elas roda, roda, roda e dispois se senta
Em cima do prato da lâmpida pra descansá"
Adoniran Barbosa
Maio 10
Mesmo que o número de católicos esteja diminuindo, está longe de ser o pior momento. Houve época em que eram centenas, em que eram doze.
Não importa.
Não há como negar a centralidade da Igreja e, em especial, do Papa no mundo — neste aqui, no mundinho material.
A quantidade de gente de outras religiões e até mesmo não religiosos, ou mesmo antirreligiosos, dando palpite sobre o papado é impressionante.
Parafraseando o grande @pergunteaorasta, a Igreja foi fundada, e inúmeros triplex foram inaugurados simultaneamente nas cabeças ao redor do mundo.
Podem discordar se ele é bom, mau, conservador, progressista — só não podem discordar que ele está em um trono.
Em "termos evolianos" (lembram do Evola? Tá meio sumido, o menino), antes de toda e qualquer realidade divina que o justifique, é o único representante cristalino de uma monarquia realmente tradicional — aquela que existe por si só e em que todo o resto orbita.
Toda essa agitação é uma confirmação visível pra mim.
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"As mariposa quando chega o frio
Fica dando vorta em vorta da lâmpida pra si isquentá
Elas roda, roda, roda e dispois se senta
Em cima do prato da lâmpida pra descansá"
Adoniran Barbosa
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O diálogo entre Félix e Lívia, no capítulo XI de Ressurreição, de Machado de Assis, no qual Lívia revela seu passado e Félix se abre francamente sobre suas inseguranças, mostra como o autor consegue delinear com notável precisão a estrutura de um relacionamento — especialmente de um relacionamento em crise.
Do lado de Lívia, ele descreve o choque entre o sonho e a realidade.
Lívia, viúva, fala a Félix sobre seu casamento anterior. Diz que amava verdadeiramente o marido — com o romantismo típico das jovens. Ele, por sua vez, embora fosse um homem bom, amava com moderação: um amor conjugal, sem ardores, sem asas e sem ilusões.
Ela conta que tentou envolvê-lo na atmosfera de seus sentimentos, mas ele se mantinha apático, frio e, com o tempo, cansado de suas tentativas.
Contrita, Lívia diz a Félix que perturbou a paz doméstica em nome de um sonho infantil. Talvez “contrita” não seja o termo exato — talvez apenas triste, simplesmente triste. Afinal, ela afirma que não conseguiria ser de outro modo: seria “defeituosa” e estaria “amaldiçoada” a querer demais e receber pouco.
Já o relato de Félix soa mais sombrio.
Galanteador, como já fora dito, ele admite ter desperdiçado seus afetos mais generosos em conquistas vazias, sem cálculo e sem arrependimento. A falsidade da corte e as palavras sentimentais ocas transformaram-se, para ele, em uma crença sólida na vacuidade dos sentimentos. Toda expressão de afeto, toda promessa, foi perdendo o significado e ganhando feições de falsidade. Não percebia que os sucessivos “amores de verão”, com suas palavras e promessas vazias, deixavam seu espírito árido e seco. Sem se dar conta, a misantropia invadiu seu coração — primeiro de forma irritada e violenta, depois, resignada e melancólica.
Enquanto Lívia abraçava o cadáver de um sonho frustrado, Félix abraçava a própria serpente: o diabo, a mentira, a desesperança e o amor envenenado.
Nunca foi sincero — e agora, toda entrega sincera ao amor, para ele, carrega a marca da desconfiança.
Acredito que esse romance, que leio pela primeira vez, vai ressignificar profundamente o modo como enxergo os personagens masculinos e femininos dos próximos romances que pretendo reler.
Maio 10
O diálogo entre Félix e Lívia, no capítulo XI de Ressurreição, de Machado de Assis, no qual Lívia revela seu passado e Félix se abre francamente sobre suas inseguranças, mostra como o autor consegue delinear com notável precisão a estrutura de um relacionamento — especialmente de um relacionamento em crise.
Do lado de Lívia, ele descreve o choque entre o sonho e a realidade.
Lívia, viúva, fala a Félix sobre seu casamento anterior. Diz que amava verdadeiramente o marido — com o romantismo típico das jovens. Ele, por sua vez, embora fosse um homem bom, amava com moderação: um amor conjugal, sem ardores, sem asas e sem ilusões.
Ela conta que tentou envolvê-lo na atmosfera de seus sentimentos, mas ele se mantinha apático, frio e, com o tempo, cansado de suas tentativas.
Contrita, Lívia diz a Félix que perturbou a paz doméstica em nome de um sonho infantil. Talvez “contrita” não seja o termo exato — talvez apenas triste, simplesmente triste. Afinal, ela afirma que não conseguiria ser de outro modo: seria “defeituosa” e estaria “amaldiçoada” a querer demais e receber pouco.
Já o relato de Félix soa mais sombrio.
Galanteador, como já fora dito, ele admite ter desperdiçado seus afetos mais generosos em conquistas vazias, sem cálculo e sem arrependimento. A falsidade da corte e as palavras sentimentais ocas transformaram-se, para ele, em uma crença sólida na vacuidade dos sentimentos. Toda expressão de afeto, toda promessa, foi perdendo o significado e ganhando feições de falsidade. Não percebia que os sucessivos “amores de verão”, com suas palavras e promessas vazias, deixavam seu espírito árido e seco. Sem se dar conta, a misantropia invadiu seu coração — primeiro de forma irritada e violenta, depois, resignada e melancólica.
Enquanto Lívia abraçava o cadáver de um sonho frustrado, Félix abraçava a própria serpente: o diabo, a mentira, a desesperança e o amor envenenado.
Nunca foi sincero — e agora, toda entrega sincera ao amor, para ele, carrega a marca da desconfiança.
Acredito que esse romance, que leio pela primeira vez, vai ressignificar profundamente o modo como enxergo os personagens masculinos e femininos dos próximos romances que pretendo reler.
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KYOTO / TOKYO / OKINAWA ...
Enquanto vocês discutem o Papa vai de franguinho ...