Guinea Pig e o Grotesco

O que nos atrai na violência?

No universo das locadoras de filmes em VHS, entre os anos 80 e o final dos anos 90, havia uma área misteriosa, geralmente localizada no fundo dos estabelecimentos. Essa seção era sinalizada com avisos imperativos e vigiada atentamente pelos funcionários.

Estou falando da área restrita a menores de 18 anos.

Sempre havia aqueles que, aproveitando-se da distração dos adultos, se esgueiravam para essas zonas proibidas. Todos sabiam que ali estavam os “filmes proibidos” — algo naturalmente atraente para os adolescentes.

No entanto, havia também outros fatores que levavam até mesmo crianças a se aventurarem nesse território. A curiosidade e o senso de desafio, mais ligados ao prazer de transgredir do que à luxúria, eram estimulados pelas normas de restrição explícita.

Essas restrições, tão enfáticas, mitologizavam as áreas mais proibidas das locadoras. As portas fechadas e até mesmo os avisos, que se assemelhavam a selos sagrados ou a um portal, evocavam imagens que Mircea Eliade poderia interpretar como proto-religiosas.

Obviamente, isso não passa de uma interpretação simbólica. O que essas portas guardavam, na verdade, era o lado mais animalesco da arte. No entanto, nossa memória religiosa age contra nossa vontade e distorce facilmente diante de falsos padrões.

Guinea Pig, uma obra idealizada por Satoru Ogura, é um tipo de filme de horror tão extremo que foi banido não apenas das áreas restritas, mas das próprias locadoras.

São seis filmes no total: Devil’s Experiment (1985), Flower of Flesh and Blood (1985), He Never Dies (1986), a obra-prima Mermaid in a Manhole (1988), Android of Notre Dame (1988) e Devil Woman Doctor (1990) — cada um com seu universo próprio, sem regularidade ou estética pré-estabelecida.

Apesar das proibições, que envolveram até o FBI, os filmes fizeram bastante sucesso e circularam muito. Eu diria que, se não fossem proibidos, o impacto e a circulação desses filmes provavelmente seriam menores.

Guinea Pig pode ser analisado sob a ótica do conceito que Richard Sennett chama de “tirania da intimidade”.

No espaço público, ele argumenta, é necessário aprender a arte da contenção das emoções, do silêncio e da discrição, que prevalecem como regras de conduta e civilidade.

Assim, à crescente segmentação e fragmentação da esfera pública, corresponde um investimento cada vez maior no espaço íntimo e privado, vistos como refúgios necessários para escapar do ambiente coercitivo e castrador da cidade.

O retorno simbólico ao conforto e à segurança do útero implica, segundo Sennett, um “retraimento emocional em relação à sociedade”. Esse retraimento autoriza um voyeurismo impensável no espaço público, onde o gozo, mesmo o mais contido, deve ser sublimado em nome do decoro e da moralidade comuns, mas pode ser exercido sem restrições no espaço confinado da intimidade.

É nesse espaço íntimo que o consumo do proibido e do impróprio ocorre, onde o ato de transgressão se torna uma válvula de escape para um prazer narcísico, secreto e perverso.

Os filmes da série Guinea Pig são caseiros, e não poderiam ser de outra forma. Não são cinema no sentido tradicional — como normalmente pensamos. São filmes feitos para o consumo privado, não para exibição pública em salas de cinema — e não se colocam nesse lugar apenas pela violência extrema.

Não se trata de filmes com cenas gore, mas de filmes que abordam a violência com uma abordagem quase pornográfica.

O primeiro filme da série, Devil’s Experiment, por exemplo, pouco ou nada desenvolve personagens ou narrativa. O filme, que não é nem de longe o melhor da série, retrata um grupo de três homens que abusam de uma mulher de várias maneiras. Sim, o filme é basicamente isso.

Com um estilo próximo ao found footage, o filme se apresenta como uma “filmagem real de tortura” — supostamente destinada a um experimento sobre a tolerância à dor e à humilhação.

Não preciso dizer que as cenas de violência apresentadas no filme não são autênticas (ou seja, é um falso snuff movie) e que o filme utiliza extensivamente efeitos práticos.

A linha que separa o deplorável do ousado é difícil de determinar neste filme. Ele é sádico na mais exata definição do termo. Aqui, a violência brutal e gratuita se associa a uma certa dose não assumida e subterrânea de erotismo.

No entanto, pouco importa o filme.

Esse tipo de obra causa impacto, e percebi isso no momento em que assisti.

As cenas de tortura me incomodavam. A proposta me era indigesta. Cheguei a questionar os limites da minha tolerância artística. Questionei, inclusive, se deveria ter alguma tolerância artística. Também me perguntei sobre os meus valores ao não reprimir com veemência aquilo que via. Minha vontade era protestar contra aquela aberração sem sentido e recomendar o ostracismo para aquela obra.

O nojo e a indignação cresciam em proporção à minha necessidade de controle. “Alguém tinha que censurar aquilo”, pensava eu.

Nesse momento, me achei patético, pois percebi que era apenas um filme. Todos os atores haviam consentido. Ao assistir o documentário sobre os filmes, via que, entre uma tomada e outra, todos estavam rindo e se divertindo — e provavelmente ririam ainda mais se pudessem ver meu olhar de reprovação.

Quem eu queria defender? O que eu estava defendendo? O filme não tinha uma tese. Não defendia ideologia alguma que eu pudesse usar como base para uma crítica.

O problema era eu: a minha sensibilidade estética ao sublime se tornou indistinguível de uma afetação politicamente correta.

Foi aqui que percebi o quanto me afastei daquela pessoa que frequentava livremente os cineclubes da minha cidade (presencialmente) e se permitia ser exposta a todo tipo de experiência estética, até aquelas que causavam mal-estar. Esse acúmulo de experiências me formou.

Talvez olhar melhor para uma catedral gótica francesa, que combina o sublime dos vitrais e a feiura proposital dos gárgulas, fosse a chave para o mergulho estético de que necessitava — de alguma forma, o grotesco precisa ter um lugar em nosso mundo.

Filmes

Za ginipiggu 6: Peter no Akuma no Joi-San
Hajime Tabe
1990
Sou altamente estimulado pelo bizarro e não consigo desconsiderar o fato de o filme ser uma peça surpreendentemente imprevisível de splatter comedy.
3/5
Ginî Piggu: Nôtoru Damu no Andoroido - ザ・ギニーピッグ2 ノートルダムのアンドロイド
Kazuhito Kuramoto
1989
Acredito que cada filme da série tem um papel específico: o primeiro, Experimento do Diabo, nos choca; o segundo, Flor de Carne e Osso, nos causa aflição; o terceiro, Ele Nunca Morre, nos faz rir; o quarto, Sereia em um Bueiro, nos causa nojo. Androide de Notre Dame tem a função de nos confundir.
3.5/5
ギニーピッグ マンホールの中の人魚, Ginī Piggu: Manhōru no Naka no Ningyo
Hideshi Hino
1988
O filme é estilisticamente impecável, uma verdadeira obra-prima do body horror. É o mais belo e, ao mesmo tempo, o mais repulsivo e intrigante da série, com inteligentes sugestões de reviravoltas que culminam em um engenhoso final aberto. Definitivamente, é um dos melhores filmes não apenas da série, mas do gênero.
5/5
ギニーピッグ3 戦慄! 死なない男, Ginī Piggu 3: Senritsu! Shinanai Otoko
Masayuki Hisamoto
1986
É o primeiro filme da série que tem uma estranha pegada de humor, diferente dos dois primeiros em que havia o horror de aflição puro e uma experiência pura do grotesco.
3/5
ギニーピッグ2 血肉の華, Hepburn: Ginī Piggu 2: Chiniku no Hana
Hideshi Hino
1985
Guine Pig 2 é um pseudo sunf ancorado num exercício estilístico de excesso com um subtexto poético e doentio sobre beleza, que acentua ainda mais seu caráter repulsivo.
4/5
ギニーピッグ 悪魔の実験 - Ginī Piggu: Akuma no Jikken
Satoru Ogura
1985
A linha que separa o deplorável do ousado é difícil de determinar neste filme. Ele é sádico na mais exata definição do termo. Aqui, a violência brutal e gratuita se associa a uma certa dose não assumida e subterrânea de erotismo.
3/5
Rolar para cima