O drama biográfico do boxeador Jake LaMotta (que existiu de fato) está muito além da sua fama.

Raging Bull, além de ser a maior biografia esportiva de todos os tempos, um dos maiores clássicos da história do cinema, foi o filme que salvou a vida do Scorsese.

O tema da ascensão e queda tem para Scorsese um significado especial por volta da época da produção deste filme. A ascensão estrelar de Taxi Driver em 1976, sucesso de público e crítica, foi imediatamente seguida da queda, em 1977, no lançamento do fiasco New York, New York.

Apesar do filme não ser ruim, a péssima recepção do público e a morna recepção da crítica foi suficiente para fazer com que Scorsese mergulhasse na depressão e no vício da cocaina.

Qualquer pessoa que já tenha experimentado um fulminante sucesso sabe que quanto maior, mais rápida e mais vertiginosa é a ascensão, mais doída e terrível é a sua decorrente queda.

Em Raging Bull, os paralelos são evidentes. Scorsese instrumentaliza a biografia do boxeador Jake LaMotta (interpretado por um irreconhecível Robert de Niro) para “vitrinizar” esse seu próprio momento biográfico, utilizando de um elóquio cinematográfico sofisticado e amadurecido para revelar dimensões profundas do seu inferno emocional.

Assim como o filme traça simétricas linhas paralelas entre Jake LaMotta e o próprio Scorsese, outras duas linhas são configuradas e desenvolvidas ao longo do filme: a linha que divide masculinidade e animalidade e a linha que divide violência esportiva e violência real.

Neste último paralelo, é interessante notar como as diferenças da filmagem entre a violência dentro e fora dos ringues sublinham seu discurso.

A violência nos ringues é estilizada, simétrica e, muitas vezes, permeada por uma neblina fantasmagórica – enfatizando um sentido até sobrenatural, de irrealidade, ou sublinhando seu significado de entretenimento e espetáculo, onde até o sangue jorra de forma ornamental.

A violência fora dos ringues, por sua vez, é o extremo oposto: ela é e crua, caótica, barulhenta, pouco estética e, apesar de não se traduzir tanto em mutilações, cortes e desfigurações, é extremamente mais tensa, brutal e desagradável.

Com uma combinação dessas, de técnica e verdade; com a composição fascinante de paralelos e harmonias, é impossível não tributar a esse filme a merecida alcunha de “um dos melhores de todos os tempos”.

Raging Bull resgatou o prestígio de Scorsese, tirando-o da sua fossa e recolocando-o, novamente, no panteão dos maiores diretores da história.

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