Star Trek – Série Clássica (Primeira Temporada) – Review de Todos os Episódios

Sobre Star Trek e seu criador

Star Trek (em português, Jornada nas Estrelas) é uma space opera criada por Gene Roddenberry que teve início em 1966 na televisão e perdura até hoje em formatos de séries, livros, paródias, filmes, romances, quadrinhos, jogos e brinquedos.

Gene Roddenberry é um roteirista e produtor americano com uma história fascinante. Participou de 89 missões pelas Forças Aéreas durante a Segunda Guerra Mundial e, posteriormente, atuou como piloto comercial após o conflito. Além disso, trabalhou no Departamento de Polícia de Los Angeles.

Sua biografia, repleta de patrulhas e missões militares, reflete-se profundamente na série, especialmente na figura do Capitão James Kirk – o primeiro comandante da nave fictícia USS Enterprise, da Federação Unida dos Planetas (uma projeção otimista da ONU em um futuro distante).

A U.S.S. Enterprise é simultaneamente uma nave de patrulha e exploração, com uma missão humanitária e diplomática, bem como uma poderosa máquina de guerra capaz de responder a ataques e entrar em combate. Trata-se de uma armada pacífica da Frota Estelar.

As inspirações de Roddenberry não eram inicialmente de ficção científica. Ele se baseou em faroestes como “Wagon Train” (Caravana, 1957) e romances como “As Viagens de Gulliver” (Jonathan Swift) – que traduziam aventuras em contos morais.

Star Trek, nos seus primeiros episódios, utiliza as viagens interplanetárias do Capitão James Kirk como pretexto para abordar uma variedade de temas, como o direito à predação no contexto de sobrevivência (episódio 1); a adolescência masculina e as dificuldades do homem em formação (episódio 2); a tragédia do homem que usurpa o lugar de Deus e dá o salto nietzschiano além da compaixão (episódio 3); a loucura e a perda de identidade (episódio 4); a necessidade de domar nosso lado animal e nunca fingir que ele não existe (episódio 5), para citar apenas os cinco primeiros episódios.

Além de abordar questões atemporais, Star Trek serve como uma alegoria para conflitos contemporâneos, explorando temas como guerra e paz, lealdade e submissão, autoridade e autoritarismo, assim como questões de imperialismo, economia, racismo, existencialismo, religião, coragem, disciplina, direitos humanos e tecnologia

A utopia Star Trek

Os personagens de Star Trek, representando um potencial evoluído de tecnologia e altruísmo, exploram essas questões ao longo de seus episódios.

Star Trek representa uma utopia futurista onde a humanidade se tornou uma cultura unificada, internacionalista, tecnologicamente avançada, pacífica e sem muitas nuances culturais distintas.

Alguns afirmam que a série Star Trek seria um universo paralelo onde o comunismo deu certo.

Para o bem e para o mal, a U.S.S. Enterprise é o símbolo do multiculturalismo em sua última etapa: o monoculturalismo.

Todas as nuances nacionais se dissolvem naquela nave (e se dissolveram na Terra).

Isso trouxe muitos benefícios à humanidade, como a paz, mas também um tédio existencial quase absoluto.

Tanto que a motivação da exploração da U.S.S. Enterprise em outros planetas, em outras galáxias, nunca foi muito bem explicada. Não é apenas uma necessidade de entender, mas de ver algo diferente, algo que já não existe mais na Terra: culturas distintas, tradições milenares distintas, etc.

A primeira temporada

Quando a primeira temporada de Star Trek foi ao ar em 1966, sob encomenda da NBC, não foram poucas as revistas especializadas que afirmaram que o programa não duraria muito. A Variety chegou a considerar o programa uma incrível e melancólica bagunça de confusão e complexidade.

Apesar de nenhuma dessas revistas questionar a qualidade do programa, seria difícil despertar interesse no público em geral.

Numa época em que entretenimento e complexidade tinham seus nichos muito bem delimitados, Star Trek soava pop demais para um público intelectual e intelectual demais para um público que queria apenas diversão.

O que salvou Star Trek não foi a projeção de ser um imenso produto de massa (o que nunca foi), mas sim uma comunidade de fãs engajados, que fizeram de tudo para que o programa se sustentasse no ar.

A primeira temporada da série estreou na NBC em 8 de setembro de 1966 e terminou em 13 de abril de 1967. Consistiu em 29 episódios e apresenta William Shatner como Capitão James T. Kirk, Leonard Nimoy como Spock e DeForest Kelley como Leonard McCoy.

Segue abaixo um comentário de cada episódio.

Episódio 1: The Man Trap (em português, O Sal da Terra)

⭐⭐⭐

Episódio 2: Charlie X (em português, O Estranho Charlie)

⭐⭐⭐

Episódio 3: Where No Man Has Gone Before (em português, Onde Nenhum Homem Jamais Esteve)

⭐⭐⭐⭐⭐

Episódio 4: The Naked Time (em português, Tempo de Nudez)

⭐⭐

Episódio 5: The Enemy Within (em português, Inimigo Interior)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 6: Mudd's Women (em português, As Mulheres de Mudd)

⭐⭐

Episódio 7: What Are Little Girls Made Of? (em português, De que são feitas as garotas?)

⭐⭐⭐

Episódio 8: Miri

⭐⭐⭐

Episódio 09: Dagger of the Mind (ou em português, O Punhal Imaginário)

⭐⭐⭐

Episódio 10: The Corbomite Maneuver (ou em português, O Ardil Corbomite)

⭐⭐⭐⭐

Episódios 11 e 12: The Menagerie (ou em português, A Coleção)

⭐⭐⭐⭐⭐

Episódio 13: The Conscience of the King (ou em português, A Consciência do Rei)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 14: Balance of Terror (ou em português, Equilíbrio do Terror)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 15: Shore Leave (ou em português, A Licença)

⭐⭐

Episódio 16: The Galileo Seven (ou em português, O Primeiro Comando)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 17: The Squire of Gothos (ou em português, O Senhor de Gothos)

⭐⭐

Episódio 18: Arena

⭐⭐⭐

Episódio 19: Tomorrow is Yesterday (ou em português, O Amanhã é Ontem)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 20: Court Martial (ou em português, Corte Marcial)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 21: The Return of the Archons (ou em português, A Hora Rubra)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 22: Space Seed (ou em português, Sementes do Espaço)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 23: A Taste of Armageddon (ou em português, Um Gosto do Armagedom)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 24: This Side of Paradise (ou em português, Deste Lado do Paraíso)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 25: The Devil in the Dark (ou em português, O Demônio da Escuridão)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 26: Errand of Mercy (ou em português, Missão de Misericórdia)

⭐⭐⭐⭐

Episódio 27: The Alternative Factor (ou em português, O fator alternativo)

⭐⭐⭐

Episódio 28: The City on the Edge of Forever (ou em português, A Cidade a Beira da Eternidade)

⭐⭐⭐⭐⭐

Episódio 29: Operation -- Annihilate! (ou em português, Operação Aniquilar)

⭐⭐⭐
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Episódio 1: The Man Trap (em português, O Sal da Terra)

3/5

The Man Trap” é o primeiro episódio da primeira temporada de Star Trek, que foi ao ar em 8 de setembro de 1966 pela NBC – no entanto, não foi o primeiro a ser produzido. Já havia outros quatro ou cinco episódios prontos antes deste.

A decisão da NBC foi típica de um vulcano: totalmente lógica. Para a emissora, era necessário apresentar um episódio impactante e este era o mais assustador e que melhor poderia ser explorado comercialmente.

No enredo, uma misteriosa criatura sugadora de sal aterroriza a Enterprise e mata seus tripulantes.

Apesar de parecer mais uma história típica de monstros e mistérios à la Pulp Fiction, no melhor estilo Twilight Zone, “The Man Trap” não se furta de apresentar algumas questões éticas e filosóficas bastante interessantes.

Em dado momento, a criatura assassina se revela como a última de sua espécie e os tripulantes da U.S.S. Enterprise discutem se seria justo eliminá-la ou culpá-la pelas mortes que cometeu.

A atividade predatória da criatura era o exercício simples de um direito natural de sobrevivência; uma busca desesperada por autopreservação – uma empreitada famélica contra a morte; algo a que todos nós, em situação extrema, estamos sujeitos.

Episódio 2: Charlie X (em português, O Estranho Charlie)

3/5

Neste segundo episódio, a Enterprise U.S.S. resgata um jovem instável de 17 anos que passou 14 anos sozinho em um planeta deserto.

Ao longo do episódio, descobrimos que ele possui poderes mentais sobre-humanos e é uma pessoa perigosa.

Este episódio é o primeiro de muitos a explorar o tema dos poderes psíquicos.

Também é um dos primeiros a abordar com mais ênfase temas que normalmente fogem ao escopo de uma ficção científica tradicional.

O episódio “Charlie X” acaba se tornando uma alegoria para a adolescência masculina e a paternidade.

Todas as frustrações, descobertas e angústias de Charlie são típicas da adolescência masculina. O Capitão Kirk surge aqui como uma figura paterna que deve, ao mesmo tempo, ensinar e tentar impor limites a essa fabulosa (e perigosa) força da natureza.

Episódio 3: Where No Man Has Gone Before (em português, Onde Nenhum Homem Jamais Esteve)

5/5

Neste episódio, a U.S.S. Enterprise cruza uma grande barreira (uma névoa cósmica misteriosa) no limite da galáxia, desencadeando um estranho fenômeno luminoso que afeta os tripulantes Gary Mitchell e Elizabeth Dehner. Esses dois tripulantes desenvolvem poderes análogos aos de Deus e se tornam uma ameaça a todos da nave.

Este episódio peculiar foi escrito por Samuel A. Peeples, dirigido por James Goldstone e filmado em julho de 1965.

Trata-se de um dos episódios mais interessantes da saga, trazendo discussões envolvendo temas como “raça superior” e uma linha de discussão teológica/filosófica interessante sobre o perigo de um ser humano se tornar como Deus.

É um dos episódios com mais substância intelectual, sendo pontuado por excelentes frases como “Poder absoluto, corrupção absoluta” ou “A moralidade é para os homens, não para um deus”.

Gary Mitchell se transforma em um incrível vilão nietzscheano, que está além do bem e do mal e que aboliu a fraqueza da misericórdia e da compaixão em seu coração (posturas típicas de escravos, adeptos de uma “degeneração” cristã).

Outro filósofo mencionado no episódio é Espinosa, filósofo holandês.

Antes de entender toda a dimensão e alcance de seus poderes, Gary Mitchell se dedica à apreensão de todo o conteúdo da obra filosófica do autor.

Para Espinosa, o componente do juízo de valor é intrínseco a um componente afetivo. Segundo o autor, nosso conhecimento dos valores morais é inteiramente redutível a um estado emocional – como, por exemplo, o conhecimento de Deus (o bem supremo), que comporta em si o componente afetivo da alegria.

Gary Mitchell quer reger toda a existência com o direito divino que lhe é próprio. Assim como a vontade de Deus é o supremo bem, Mitchell, acreditando ser Deus, toma para si suas ambições, desejos e vontades como supremo bem.

Episódio 4: The Naked Time (em português, Tempo de Nudez)

2/5

Neste episódio, uma epidemia atinge a U.S.S. Enterprise, fazendo com que alguns membros da tripulação diminuam suas inibições emocionais, colocando, mais uma vez, a nave em perigo.

Embora seja um dos episódios mais bem conceituados da série, entrando na lista dos “10 episódios clássicos” da IGN e sendo o favorito de George Takei (que interpreta Hikaru Sulu, o oficial do leme da U.S.S. Enterprise), é um dos episódios mais estranhamente cômicos da primeira temporada, beirando o ridículo.

A proposta dele é puro entretenimento e uma boa demonstração da maleabilidade de tom da própria série.

Star Trek tem episódios para todos os gostos. Há os que se assemelham mais ao terror (no melhor estilo Twilight Zone), os que são pura ficção científica (no melhor estilo Arthur C. Clarke ou Isaac Asimov), os que são puro mistério investigativo (no melhor estilo Agatha Christie, Arthur Conan Doyle ou G.K. Chesterton) e outros são puro humor (como este episódio, no melhor estilo Monty Python).

Episódio 5: The Enemy Within (em português, Inimigo Interior)

4/5

A premissa deste episódio é bastante simples: um problema no teletransporte da nave U.S.S. Enterprise divide o Capitão Kirk em duas versões dele mesmo – uma boa e outra má.

O tema do doppelgänger já foi amplamente explorado na literatura, em obras como “O Médico e o Monstro” (Robert Louis Stevenson) e “William Wilson” (Edgar Allan Poe).

Embora simples, este é um dos melhores episódios de toda a série. Existe uma discussão interessante sobre o duplo e sobre o bem e o mal em cada um de nós.

O Capitão Kirk, separado de sua bondade e compaixão, torna-se tirânico, agressivo e lascivo.

Por sua vez, Kirk, privado de sua agressividade, torna-se fraco.

Para comandar a U.S.S. Enterprise, as duas partes do Capitão tornam-se essenciais – e é necessário que elas convivam no mesmo coração. O lado negativo, no final das contas, não é necessariamente prejudicial, mas uma força bruta a ser dominada e sublimada pela inteligência, razão e moralidade. Não é desejável que o lado agressivo seja anulado em um homem, especialmente em um capitão de uma nave – mas sim, educado.

Em termos psicológicos junguianos, “The Enemy Within” ilustra o básico sobre os perigos da não aceitação e não integração do “shadow-self” (seu lado sombrio) com a persona.

O “self” e o “shadow-self” são substitutos junguianos para o que Freud definiu como consciente e subconsciente. Neste caso, é preferível utilizar os termos junguianos para criar uma clara distinção de valor e hierarquia. O “shadow-self” deve ser submisso ao “self” na medida do possível, pois é isso que nos faz pessoas minimamente ordenadas.

Episódio 6: Mudd's Women (em português, As Mulheres de Mudd)

2/5

Em uma perseguição no espaço, a U.S.S. Enterprise captura e prende os ocupantes de uma nave.

É levado a bordo um mercenário interestelar chamado Harry Mudd e três mulheres deslumbrantes, que seriam sua mercadoria.

Kirk, sua tripulação, Harry Mudd e as três mulheres a bordo viajam até um planeta minerador para obter novos cristais de lítio (essenciais para o abastecimento energético da nave).

Neste planeta, Mudd negocia com os três habitantes que lá vivem, trocando as mulheres pelos cristais de lítio para benefício próprio.

Este é um dos episódios que certamente traria problemas para os realizadores se fosse feito hoje. Especialmente por mostrar as mulheres como objeto de troca e apresentar o tema do tráfico humano com certo tom erótico e cômico (embora claramente não complacente).

No entanto, não deixa de ser interessante algumas discussões tratadas, como a beleza feminina, a necessidade masculina de companhia feminina e os papéis femininos e masculinos num relacionamento.

Embora o esforço de relativização das características de gênero seja a tônica do discurso politicamente correto atual, essas questões sempre foram e sempre vão ser pertinentes à nossa natureza.

Episódio 7: What Are Little Girls Made Of? (em português, De que são feitas as garotas?)

3/5

À procura do noivo da enfermeira Chapel, o renomado exobiólogo Roger Korby, a U.S.S. Enterprise visita o gelado planeta Exo III, onde Korby descobriu uma antiga máquina que o permite duplicar qualquer pessoa viva em um andróide.

Estes androides seriam versões aperfeiçoadas de nós mesmos – mas sem o fator de imprevisibilidade que nos torna humanos, o que os torna facilmente manipuláveis.

O Dr. Korby insiste que os humanos seriam melhorados como androides, que podem ser programados sem ciúmes, ganância, ódio, sem mortes, deformidades e até mesmo sem medo.

Ele planeja usar a máquina para espalhar androides controlados por ele em toda a Federação.

Neste episódio, temos pertinentes discussões sobre transhumanismo e identidade.

Parte que nos define como humanos é nossa debilidade, nossa finitude e nossa sujeição ao imprevisível, ao pecado, ao machucado e à dor.

Se pudéssemos suprimir não apenas falhas, mas a própria possibilidade de cometê-las, nós nos despersonalizaríamos e estaríamos mecanizados (como verdadeiros androides), e isso não seria desejável.

Curiosidade: há referência às obras de H. P. Lovecraft com menção aos “Antigos” (The Old Ones) e à aparência das portas trapezoidais nas cavernas do planeta Exo III.

Episódio 8: Miri

3/5

Depois de descobrir o que parece ser uma duplicata do planeta Terra, o Capitão Kirk e seu grupo de desembarque encontram uma população devastada por uma estranha doença, que só as crianças parecem ter sobrevivido.

Parte desse episódio lembra Peter Pan de Francis Donkin Bedford, parte lembra sua versão mais sombria, A Colheita Maldita (de Stephen King).

Talvez seja um dos episódios mais polêmicos da série, por motivos bastante misteriosos.

Após a primeira exibição de Miri na televisão britânica em dezembro de 1970, a BBC recebeu uma série de reclamações sobre o conteúdo do episódio: a quantidade e a natureza das reclamações nunca foram divulgadas.

A BBC se recusou a mostrar o episódio novamente durante suas muitas repetições nas décadas de 1970 e 1980, e também proibiu três episódios adicionais: “Plato’s Stepchildren” (décimo episódio da terceira temporada), “The Empath” (décimo segundo episódio da terceira temporada) e “Whom Gods Destroy” (décimo quarto episódio da terceira temporada).

Os fãs que escreveram à BBC para reclamar da proibição durante a 5ª repetição em meados da década de 1980 receberam uma resposta padrão: 

“Não há planos de exibir os quatro episódios porque sentimos que eles lidam de forma desagradável com os já desagradáveis ​​temas da loucura , tortura, sadismo e doença. Isso deve ser levado em consideração já que, dentre os numerosos e entusiásticos seguidores de Jornada nas Estrelas, muitos são jovens que assistiriam ao programa, não importa a hora do dia em que a série fosse incluída na programação.” 

A proibição foi finalmente suspensa no início de 1990 para a 6ª exibição da série pela BBC.

Em 2020, também foi exibido na Grã-Bretanha, no Horror Channel.

Essa censura foi uma das mais estúpidas da TV pois o episódio não é prejudicial, mas altamente recomendável para jovens. 

A doença que acomete o planeta é a doença da maturidade.

Assim como Charlie X (segundo episódio desta mesma temporada), este episódio trata das dores da maturidade, com um foco mais direcionado na transformação feminina, além de fazer inteligentes paralelos entre transformação do corpo, mudanças hormonais e uma simbólica “morte” da infância (que no roteiro é literal mas como, obra de arte, podemos imprimir um sentido metafórico válido).

Episódio 09: Dagger of the Mind (ou em português, O Punhal Imaginário)

3/5

No episódio, a U.S.S. Enterprise, em uma missão de abastecimento, visita uma instalação de reabilitação para criminosos insanos, onde o médico-chefe usa um dispositivo que destrói a mente humana.

Os criminosos acabam assumindo o controle do hospício e sequestram o capitão Kirk e seus companheiros.

Este episódio apresenta a fusão mental vulcana.

O título (em inglês) é retirado de um solilóquio do personagem-título da peça Macbeth de William Shakespeare.

Existe uma discussão nesse episódio em cima de temas como memórias, hipnose, sugestão e também sobre o sistema prisional, com algumas acentuações políticas.

Episódio 10: The Corbomite Maneuver (ou em português, O Ardil Corbomite)

4/5

“The Corbomite Maneuver” foi ao ar em 10 de novembro de 1966 pela NBC. Foi o primeiro episódio de produção normal da série depois dos dois pilotos, apesar de ter ido ao ar posteriormente na temporada. Foi escrito por Jerry Sohl e dirigido por Joseph Sargent.

Trata-se de um episódio que absorve muito do estilo de Arthur C. Clarke e Isaac Asimov.

Neste episódio, a U.S.S. Enterprise encontra um estranho cubo no espaço, que começa a se aproximar da nave e emitir uma perigosa radiação.

Capitão Kirk ordena então a destruição do objeto e, pouco tempo depois, uma gigantesca nave composta por esferas, tão misteriosa quanto o cubo, se aproxima da U.S.S. Enterprise.

O  comandante desta nave se identifica como Balok. A nave seria a Fesarius, a capitânia da “Primeira Federação”. 

Balok se mostra como um humanóide de aspecto monstruoso. 

Ele ignora as saudações de Kirk e seu apelo de paz, anunciando a intenção de destruir a U.S.S. Enterprise por invadir o território da Primeira Federação e destruir o demarcador de fronteira – o cubo.

 Balok informa que eles têm dez minutos para orar para seus respectivos deuses antes da destruição.

Essa situação é contornada quando o capitão Kirk blefa para Balok dizendo que a U.S.S. Enterprise incorporou uma substância conhecida como Corbomite.

O papel do Corbomite seria proteger a nave – trataria-se de uma arma passivo-agressiva que absorveria qualquer energia destrutiva que tocasse a U.S.S. Enterprise e criaria uma reação reversa de igual força que destruiria o agressor.

O interessante dessa história toda é que o Corbomite nunca existiu. Foi uma invenção do capitão Kirk,. que fez um jogo cerebral 

Aparentemente, caindo no estratagema, Balok não destrói a nave como anunciado. 

Além das instigantes concepções de formas abstratas na ficção-científica, este episódio é  um jogo cerebral de poker intergalático. 

Poker vs Xadrez

É interessante o embate entre Kirk e Spock a respeito das diferenças entre o Poker e o Xadrez. 

Spock é um exímio jogador de Xadrez, Capitão Kirk é um exímio jogador de Xadrez e também de Poker. 

O Xadrez é um jogo de regras definidas que podem ser determinadas matematicamente. 

O Poker, por sua vez, se vale muito mais de probabilidades e manipulações, sendo um jogo muito mais suscetível a blefes, trapaças e pecados, além de aceitar a imprevisibilidade e acontecimentos aleatórios da própria sorte (que, por si, admite uma certa parcela de caos ou mistério).

Kirk é justo mas é plenamente humano – está sempre suscetível à queda, a mancha do pecado original – a possibilidade de falha.  Existe sempre uma sombra de dubiedade, raiva, loucura e desespero que o acompanha.

Exatamente por isso que Kirk, e não Spock, é o capitão da U.S.S. Enterprise. Ele comanda homens e homens são muito mais do que matemáticos ou lógicos.

Chesterton iria adorar Star Trek.

Em Ortodoxia, entre outras coisas, ele escreveu um mini-ensaio de ficção-científica star-trekiana onde imaginou um homem da lua examinando nosso corpo e tentando entender quem somos.

“Se o nosso matemático da lua visse dois braços e duas orelhas, ele poderia deduzir as duas omoplatas e as duas metades do cérebro. Mas se ele adivinhasse que o coração do homem estava no lugar certo, então eu deveria chamá-lo de algo mais que um matemático.”

Além de ser um dos melhores episódios de toda a série, funciona excepcionalmente bem como uma introdução ao conceito de Star Trek, dos tropos narrativos até a lógica da narrativa. 

O Ardil Corbomite é um tijolo sobre o qual episódios posteriores se baseiam.

Episódios 11 e 12: The Menagerie (ou em português, A Coleção)

5/5

Trata-se do único episódio que é dividido em 2 partes. Ambos foram lançados em novembro de 1966 pela NBC.

Neste episódio, Spock comete motim na U.S.S. Enterprise para levar Christopher Pike, seu ex-comandante, de volta ao planeta proibido Talos IV. Acabamos descobrindo que anos antes, Pike e Spock visitaram o planeta, onde Pike sofreu uma mutação horrível – e Spock está tentando fazer com que seu ex-comandante seja curado.

Este episódio é uma manobra de remanejamento de um outro episódio não-lançado chamado The Cage (que seria o primeiro programa piloto da série, recusado pela NBC) e aprofunda as nuances de misericórdia e lealdade de Spock dentro dos ditames da sua própria lógica imperativa. 

Trata-se de um dos melhores desenvolvimentos de personagem de toda a série. 

Em 1967 venceu o Hugo Award (prêmio que é entregue anualmente para os melhores trabalhos e realizações de fantasia ou ficção científica do ano anterior) na categoria “melhor apresentação dramática”,. O único outro episódio da série a vencer o prêmio foi “The City on the Edge of Forever” (penúltimo episódio da primeira temporada).

O episódio também explora sobre as vantagens de se viver numa ilusão gratificante em vista de uma realidade terrível, antecipando em décadas tudo aquilo que seria mostrado em séries como Black Mirror (especialmente o famoso episódio San Junipero).

Episódio 13: The Conscience of the King (ou em português, A Consciência do Rei)

4/5

“The Conscience of the King”, escrito por Barry Trivers e dirigido por Gerd Oswald, foi ao ar pela primeira vez em 8 de dezembro de 1966.

O título do episódio deriva das linhas finais do Ato II de Hamlet: 

“O drama é o laço com o qual prenderei a consciência do rei”. 

No episódio, a U.S.S. Enterprise é chamada ao Planeta Q pelo Dr. Thomas Leighton, um amigo do Capitão Kirk, aparentemente para investigar uma possível nova fonte de alimento sintético. 

A verdadeira motivação de Leighton, no entanto, é sua suspeita de que Anton Karidian, o líder de um grupo de teatro do Planeta Q é, na verdade, Kodos – o Carrasco, ex-governador da colônia terrestre de Tarso IV. 

Kodos havia tomado o poder durante uma crise alimentar e ordenou que metade da população fosse condenada à morte; Leighton e Kirk foram testemunhas oculares. 

Kirk insiste que Kodos não pode ainda estar vivo, mas reconsidera depois de pesquisar o passado de Karidian. 

Na esperança de encontrar Karidian em uma festa na casa de Leighton, Kirk conhece sua filha Lenore. Durante uma caminhada, os dois descobrem Leighton morto.

Trata-se de um excelente episódio de estrutura shakespeariana, envolvendo o tema da conspiração e onde o poder se torna um objeto de estudo analítico. 

Kodos é um dos mais interessantes e profundos vilões da história da TV, especialmente por não ser uma figura caricata e até ousar fazer interessantes nivelações entre ele mesmo e o capitão Kirk, indubitavelmente o herói e a coluna moral da série. 

A tirania de Kodos é colocada em contexto, pois ele tomou a dura decisão de quem vive e quem morre diante de um imperativo situacional – coisa que o capitão Kirk lida diariamente no comando de sua nave. 

Tanto Kodos quanto Kirk compartilham o drama do poder de decisão e o episódio coloca isso de forma sublime.

Episódio 14: Balance of Terror (ou em português, Equilíbrio do Terror)

4/5

Escrito por Paul Schneider e dirigido por Vincent McEveety, Balance of Terror foi ao ar pela primeira vez em 15 de dezembro de 1966.

Trata-se do primeiro episódio de Star Trek remasterizado digitalmente, apresentando efeitos visuais novos e aprimorados, naves espaciais geradas por computador (CGI) e formato de alta definição.

Neste episódio, a U.S.S. Enterprise enfrenta uma nave Romulana após investigar um assaltante não identificado que destrói metodicamente os postos avançados da Federação na Zona Neutra.

Tanto os vilões quanto os protagonistas em Star Trek são multidimensionais e nesse episódio fica claro. 

Você é obviamente conduzido a ficar do lado da U.S.S. Enterprise, mas a série também não induz a você desejar a destruição do outro lado – isso porque o episódio traz os dois pontos de vista, tanto dos humanos quanto dos romulanos. 

Isso, além de não incentivar a polarização, faz você sentir toda a complexidade de uma guerra. 

É considerado por diversos críticos e revistas especializadas (como a A.V. Club, SciFiNow, Christian Science Monitor, Wired, Hollywood Reporter entre outras) como um dos melhores episódios da série clássica.

Certamente, um dos melhores episódios da série.

Episódio 15: Shore Leave (ou em português, A Licença)

2/5

No episódio, a tripulação da U.S.S. Enterprise visita um planeta bizarro onde as fantasias do grupo de desembarque se tornam realidade.

A ideia de uma “ilusão tangível” é muito recorrente na série Star Trek. O que temos em A Licença já foi trabalhado em outros episódios como O Punhal Imaginário e de forma magistral em A Coleção.

Episódio 16: The Galileo Seven (ou em português, O Primeiro Comando)

4/5

Neste episódio, Spock e um grupo de cientistas da U.S.S. Enterprise, a bordo de uma nave auxiliar de exploração chamada Galileo Seven, são enviados para estudar o quasar Murasaki 312.

Durante a pesquisa, a Galileo Seven é forçada a fazer um pouso de emergência no planeta Taurus II, onde são recepcionados por nativos hostis.

Enquanto reparos são efetuados na Galileo Seven, Scotty (engenheiro da U.S.S. Enterprise que acompanhava o grupo científico durante a exploração) determina que a nave não tem combustível suficiente para chegar em órbita com todos os passageiros, forçando Spock a contemplar a possibilidade de deixar alguns tripulantes para trás.

O terrível dilema de escolher quem vive e quem morre já foi bastante explorado no personagem do Capitão Kirk. Spock experimenta rapidamente essa amarga experiência vivida à flor da pele quase quotidianamente pelo Capitão Kirk.

Este episódio foi essencial para adicionar fascinantes camadas a um personagem já bastante fascinante e acentuar nuances da sua relação com a tripulação.

Spock tem problemas com a tripulação que não entende que sua imperiosidade lógica e racional não significa uma indiferença ou ausência de ética.

Por outro lado, Spock teve que aprender o valor humano-religioso de uma celebração fúnebre-memorial.

Neste episódio, um dos tripulantes morre e a tripulação exige de Spock, o segundo em comando da U.S.S. Enterprise e, portanto, o Capitão por direito nessa missão, que ele faça um cortejo fúnebre ao homem morto. Como Spock é um ser especialmente lógico, não vê necessidade prática nessa celebração e se inicia um excelente embate entre cerimônia, lógica e emoção numa situação de perigo e urgência.

Episódio 17: The Squire of Gothos (ou em português, O Senhor de Gothos)

2/5

Neste episódio, a U.S.S. Enterprise encontra um planeta órfão à deriva no espaço habitado por um único ser: o excêntrico Trelane.

Trelane é um sujeito que tem poderes ilimitados sobre a matéria e tem uma fascinação especial pela Terra, que ele acompanha de longe.

Trata-se de uma trama criativa, mas com aquele mesmo tema recorrente de Star Trek de “ilusões tangíveis” e antagonistas que adquirem poderes análogos aos de Deus. 

Não acrescenta muito mais do que já foi mostrado anteriormente, especialmente no episódio Where No Man Has Gone Before (episódio 3 desta temporada)

Episódio 18: Arena

3/5

Famoso episódio onde acontece uma luta entre Capitão Kirk e um homem-jacaré.

A U.S.S. Enterprise é atacada por alienígenas desconhecidos enquanto investigava a quase destruição da colônia de Cestus III. 

Enquanto persegue os alienígenas pelo espaço, ambas as naves são capturadas pelos poderosos Metrons, que forçam Kirk e o capitão alienígena a entrar em um julgamento por combate: a nave do vencedor será libertada, enquanto a nave do perdedor será destruída.

Apesar de algumas cenas deste episódio parecer cômicas hoje, trata-se de um dos episódios que mais impressionaram na época e até hoje é um dos mais elogiados pelos críticos.

Existe um interessante debate entre civilização, retaliação e misericórdia.

Para os poderosos Metrons, os humanos ainda são bárbaros por manterem o recurso da hostilidade, mesmo que justificada, na resolução dos seus conflitos.

No entanto, os Metrons também notaram que possuímos um esperançoso potencial civilizacional, que foi demonstrado quando o capitão Kirk foi misericordioso com seu rival depois que o venceu na batalha, teve a chance de executá-lo e escolheu a piedade.

Episódio 19: Tomorrow is Yesterday (ou em português, O Amanhã é Ontem)

4/5

Escrito por D.C. Fontana e dirigido por Michael O’Herlihy, trata-se do primeiro episódio da Star Trek a lidar diretamente com a questão da viagem no tempo e com a problemática bradburyana do paradoxo temporal apresentada em seu livro A Sound of Thunder.

No paradoxo temporal de Ray Bradbury, ao se viajar ao passado, temos que ter todo cuidado para deixar o curso dos acontecimentos intactos, visto que mesmo uma alteração mínima pode causar mudanças gigantescas no futuro (isso foi popularizado no termo “efeito borboleta”).

No enredo deste episódio, a nave estelar U.S.S. Enterprise é jogada no tempo até 1969 na Terra, depois dos efeitos de uma estrela negra. 

A nave fica em uma posição suborbital da atmosfera terrestre, sendo captada como um OVNI em um radar militar de uma base aérea de Nebraska.

A base terrestre envia um F-104 Starfighter, pilotado pelo Capitão John Christopher, para identificar a nave. 

O piloto recebe ordens para impedir que a U.S.S. Enterprise escape antes que reforços cheguem, e Kirk é forçado a tomar atitudes defensivas. A nave estelar emite um raio trator em direção ao jato, porém acidentalmente a parte ao meio. Agindo de forma rápida, Kirk ordena que o piloto seja transportado para dentro da U.S.S. Enterprise – criando toda a problemática da linha-temporal mencionada.

Trata-se de um episódio interessante e curioso sobre o tema, fazendo a antessala temática do premiado episódio “The City on the Edge of Forever”.

Episódio 20: Court Martial (ou em português, Corte Marcial)

4/5

O Capitão Kirk é colocado em corte marcial por negligência depois de um tripulante ser morto em uma tempestade iônica. Kirk afirma que suas ações foram adequadas e que elas não deveriam ter levado o tripulante à morte, porém as evidências são fortes contra ele – especialmente por suas ações estarem registradas e documentadas no diário-computador da Enterprise (uma máquina).

Este é certamente um dos melhores episódios de toda a série por apresentar questões pertinentes ao direito em roupagem sci-fi como culpa, dolo, inocência e a legalidade dos trâmites num processo de julgamento e uma fenomenal crítica ao tecnicismo ultra-positivista.

Deixar o destino de um homem ser decidido pelas “acusações” de uma máquina é algo que sinaliza um terrível destino tecnocrata por eliminar completamente as nuances humanas do julgamento – como se fosse moral que o destino de uma vida fosse determinado como um resultado de uma equação mecânica, fria e matemática.

A cena do julgamento em si, onde o advogado de Kirk, Samuel T. Cogley (representado magistralmente por Elisha Cook Jr) apresenta suas razões de defesa, é uma das mais bem escritas da história da TV (não apenas da série). 

Há memoráveis exposições em seu discurso perante os juízes, tais como:

“Agora eu tenho algo humano a lhe falar! Direitos! Direitos Humanos! A Bíblia. O Código de Hamurabi e de Justiniano. A Magna Carta. A Constituição dos Estados Unidos. A Declaração Fundamental das Colônias Marcianas. Os Estatutos de Alpha 3. Cavaleiros! Estes documentos falam de direitos! Direitos do acusado, de ser julgado por seus pares, de ser representado por um advogado. O direito do interrogatório. Mas, o mais importante, o direito de confrontar as testemunhas contra ele. Um direito que foi negado ao meu cliente (…). A mais devastadora testemunha contra o meu cliente não é um ser-humano, mas uma máquina! Um sistema de informação. O diário-computador da Enterprise e eu peço que possamos nos reunir na nave! (…) Eu falo de direitos! A máquina não tem direitos, mas o homem sim! Meu cliente tem o direito de encarar seu acusador. E se vocês não nos derem esse direito, estarão nos colocando no nível de máquinas! Ou então, estarão elevando as máquinas acima de nós! Eu peço que a minha moção seja aceita. E mais ainda, cavalheiros. Em nome de uma humanidade que está sumindo a sombra da máquina, eu exijo isso! Eu exijo isso!! “



Episódio 21: The Return of the Archons (ou em português, A Hora Rubra)

4/5

Escrito por Boris Sobelman e dirigido por Joseph Pevney, este episódio foi ao ar pela primeira vez em 9 de fevereiro de 1967 e é baseado em uma história própria de Gene Roddenberry – criador da série.

No episódio, a U.S.S. Enterprise chega ao planeta Beta III do cistema C-111, que vive em uma cultura ao estilo da Terra do século XIX governada por legisladores encapuzados e um ditador recluso, Landru.

Sua chegada é logo seguida pelo “Festival”, onde todos do planeta experimentam um breve período de violência, destruição e agressividade sexual.

Depois do “Festival”, toda população volta “ao normal”, sendo extremamente corteses e civilizados. Para quem já assistiu The Purge, a ideia do filme parece ter sido inspirada nesse episódio. 

Neste episódio temos três personagens icônicos da série representando seus arquétipos diante de estímulos contraditórios. Temos Kirk (liderança, bondade e coragem), Spock (lógica e curiosidade) e McCoy (ciência e fé) diante de um ambiente ambíguo de alternância entre etiqueta puritana e rompantes de violência lasciva e hedonismo.   

No episódio é dito que o ditador recluso Landru está por trás dos estranhos eventos dessa cultura, controlando cada membro da população através do que ele chama “absorção pelo corpo”.

Como todo ditador, a motivação de Landru se arroga benéfica e salvífica. Para ele, o controle mental de todos os indivíduos de Beta III evitou períodos de guerra e anarquia 6.000 anos atrás (o “Festival” seria uma forma de lidar com o impulso de morte presente em todos os seres humanos).

Landru, porém, não passa de uma projeção de um computador que foi programado para proteger a população de eventos catastróficos. Para isso, o computador destruiu a criatividade das pessoas e proibiu seu livre arbítrio.

Ótimo episódio sobre a dissolução da personalidade em uma espécie de “corpo coletivo” e sobre a dissolução da individualidade que se traduz em uma paz e um contentamento vazio e assustador.

Episódio 22: Space Seed (ou em português, Sementes do Espaço)

4/5

Sementes do Espaço foi escrito pelo produtor da série Gene L. Coon e Carey Wilber, baseado em uma história concebida por Carey Wilber, e dirigido por Marc Daniels. 

Posteriormente este episódio serviu como base para o filme Star Trek II: The Wrath of Khan.

No enredo do episódio, a tripulação da Enterprise acorda um poderoso ditador do passado da Terra chamado Khan, que estava congelado criogenicamente. 

Além de apresentar um dos mais icônicos vilões de toda a série e trabalhar muito bem conceitos interessantíssimos sobre o desejo de conquistar, este episódio revela nuances bastantes peculiares da atração sexual feminina por figuras masculinas de poder.

Khan, um homem forte, bonito e aventureiro (apesar de perverso), seduz facilmente uma das tripulantes da U.S.S. Enterprise e busca, com a ajuda dela, tomar a nave do Capitão Kirk.

Sementes do Espaço transforma um sci-fi espacial em uma exposição bruta da natureza selvagem e primitiva, onde temos dois macho-alfas (capitão Kirk e Khan) numa disputa sem escrúpulos pela dominância do seu território.

É considerado por muitos um dos melhores episódios da série.

Episódio 23: A Taste of Armageddon (ou em português, Um Gosto do Armagedom)

4/5

“A Taste of Armageddon” é um episódio bastante criativo escrito por Robert Hamner e Gene L. Coon e dirigido por Joseph Pevney.

Neste episódio, a tripulação da U.S.S. Enterprise visita um planeta envolvido em uma guerra totalmente simulada por computador com um planeta vizinho onde as vítimas, incluindo a tripulação da Enterprise, são supostamente reais – como se fosse um grande jogo de Batalha Naval.

As vítimas, ao serem “atingidas”, devem entrar em câmaras de suicídio e serem contabilizadas como baixas.

Esse inusitado e absurdo acordo de guerra é visto como uma “evolução” do conflito bélico, onde a hostilidade se mantém sem a necessidade de uma devastação territorial.

Ou seja, temos uma situação conflituosa contornando o horror da guerra de uma maneira asséptica, onde as baixas são dadas sem destroços, sem desmembramentos e sem sangue. 

À primeira vista, parece uma ótima ideia, mas isso significou a duração da guerra em mais de 500 anos sem nenhum sinal de conciliação, trégua ou acordo.

A conclusão é sensacional: nós só damos valor a paz pois sabemos o valor destrutivo de uma guerra. 

Em suma: precisamos sentir o “gosto do armagedom” para entendermos a paz. 

Episódio 24: This Side of Paradise (ou em português, Deste Lado do Paraíso)

4/5

“This Side of Paradise” foi escrito por D. C. Fontana, baseado em uma história concebida por Fontana e Nathan Butler (pseudônimo do roteirista Jerry Sohl), e dirigido por Ralph Senensky.

No enredo, a Enterprise visita um planeta onde seus habitantes estão sob a influência de uma estranha planta nativa que simplesmente traz felicidade para quem tem contato com ela.

Em contrapartida, você perde seu senso de lucidez.

Neste episódio, Spock, o inquestionavelmente mais lógico e metódico dos tripulantes da U.S.S. Enterprise, é influenciado por essa planta e tem agradáveis momentos com Leila, uma habitante local do qual se apaixona.

Este episódio pode ser visto de diversas formas, inclusive como uma exposição metafórica aos perigos narcóticos e o quanto é imperativo antes estar lúcido e com posse plena da sua mente do que estar “feliz”.

Resgato aqui o podcast feito em tributo a Santo Agostinho pelo Tavena do Lugar Nenhum:

Existe em Confissões excelentes discussões sobre felicidade, alegria, sofrimento e tristeza.

Nada ficou tão claro sobre a diferença brutal entre alegria e felicidade do que o esclarecedor relato de Santo Agostinho em Confissões, quando este andava triste pelas ruas de Milão e encontrou em seu caminho um mendigo ébrio, humorístico e alegre.

Santo Agostinho, que andava “sob os ferrões da paixão” (que era a angústia da sua vocação, a saudade da mãe, a morte de um amigo, as lembranças de um amor, uma vontade frustrada de se casar e uma febre) se depara com o tal mendigo bêbado e percebe que ele possuía algo que a maioria das pessoas no mundo (inclusive ele) não possuía e buscava incessantemente: uma alegria segura.

O homem que folgava na embriaguez e transbordava na hilaridade possuía um simulacro de felicidade forte o bastante que tudo o fazia rir, até as pancadas que lhe davam.

No entanto, Agostinho, que viva com o coração cheio de inquietações, era verdadeiramente feliz.  

A complexidade do cristianismo é revelar que não existe a contradição de felicidade e sofrimento.

É uma questão de inteligência perceber o sentido da vida de um hedonista se completa verdadeiramente numa morte por overdose ou na triste figura de uma pessoa sorridente e suja na sarjeta. Se alguém identificar essa alegria com felicidade, só pode ser louco.

Diz Santo Agostinho:

“Se alguém me perguntasse, se preferia andar alegre ou perturbado, responderia: andar alegre. Se, porém, de novo, me interrogasse se antes queria ser como o ébrio ou como eu era, escolheria viver acabrunhado por cuidados e temores. (…) Afastem-se, pois, da minha alma, os que lhe brandam: o importa é que haja motivo para alegria.”

Spock e toda tripulação da U.S.S. Enterprise se recuperam dessa alegria entorpecente e voltam, meio melancólicos, ao seu dever na nave e nas suas missões de exploração.

Episódio 25: The Devil in the Dark (ou em português, O Demônio da Escuridão)

4/5

Este episódio foi escrito pelo produtor executivo da série Gene L. Coon e é dirigido por Joseph Pevney.

Neste episódio, a U.S.S. Enterprise é enviada para uma colônia mineradora no planeta Janus VI para investigar informes de uma estranha criatura que recentemente destruiu equipamentos e matou 50 mineiros com uma poderosa substância corrosiva.

A curiosidade de Spock é despertada por um objeto esférico na mesa do supervisor da mina, Engenheiro Chefe Vanderberg, que diz se tratar de um dos milhares de nódulos de silício encontrados nos níveis recém abertos da mina, porém sem valor comercial.

Esses nódulos de silício seriam, na verdade, os ovos de uma criatura única – que, no decorrer do episódio, ficamos sabendo se tratar de um ser consciente, inteligente e assustado – que apenas estava tentando se proteger e garantir a segurança de sua prole.

Tudo neste episódio, até esse derradeiro descortinamento temático, caminha para ser um típico “episódio de monstro” – algo que beira o terror e o mistério – mais uma vez remetendo a série Twilight Zone, tal como o primeiro episódio (The Man Trap).

No entanto esse excelente episódio se mostra, no final de tudo, uma interessante exposição de ficção-científica nos mostrando uma criatura viva com base em silício (e não carbono), com consciência e em estado de agonia – capaz de tristeza e elucubrações sobre morte e finitude (coisas que são descobertas por Spock, através de suas técnicas vulcanas de leitura mental).

Também é um ótimo episódio de moral ecológica, onde, no final, vemos que a cooperação entre as criaturas (os exploradores humanos e a criatura de silício) se torna a solução final mais adequada, com benefícios para ambas as partes.

Episódio 26: Errand of Mercy (ou em português, Missão de Misericórdia)

4/5

Escrito por Gene L. Coon e dirigido por John Newland, foi o primeiro episódio a aparecer os Klingons, que se tornariam clássicos antagonistas da frota estelar.

Neste episódio, com uma guerra contra os Klingons declarada, o Capitão Kirk e seu Primeiro Oficial, Sr. Spock, tentam influenciar a população incompreensivelmente plácida de um planeta chamado Organia, próximo à fronteira Klingon, para resistir a uma ocupação militar invasora.

À primeira vista, Organia é um planeta pacato e tecnologicamente primitivo, governado por um chefe de conselho local chamado Ayelborne.

Kirk apela para Ayelborne para permitir que a Federação os ajude a resistir à ocupação Klingon, mas os organianos se opõem veementemente a qualquer uso de violência. 

Frustrado com o pacifismo dos organianos (que ele interpreta como um sinal de submissão e covardia), mas obediente ao código estelar formal de não intervenção, Kirk ordena imediatamente a retirada da U.S.S. Enterprise da órbita de Organia, enquanto permanece no planeta disfarçado, junto com Spock, testemunhando a tomada do planeta pelo comando militar Klingon e tentando resolver o problema da ocupação com ações alternativas (incluindo terrorismo e táticas de guerrilha – também condenados pelos organianos).

No final do episódio, Kirk e Spock invadem a sede Klingon em Organia na esperança de despertar a resistência da população e dos lídres. Eles capturam Kor (líder militar Kinglon que comandava a ocupação de Organia) e se preparam para fazer uma última ação de resistência. 

Os Organianos então revelam sua verdadeira natureza: eles são seres incorpóreos altamente avançados. 

Eles instantaneamente incapacitam ambos os lados, forçando-os a concordar com o fim das hostilidades e prevendo que os dois lados trabalharão juntos no futuro.

Este episódio é muito bem conduzido e te manipula por diferentes polos de opiniões. No começo, damos razão a Kirk em considerar os organianos como uma raça medieval estupidamente pacifista e covarde e terminamos com a revelação de que eles, na verdade, são seres muito além da nossa evolução: avançados, pacíficos, poderosos, imortais e incorpóreos. Quase como deuses benevolentes.

Existem falhas lógicas no episódio. A propalação do pacifismo organiano não vem de uma tônica moral superior ou uma “evolução”, mas uma circunstancialidade baseada na capacidade do poder deles, que está acima do poder bélico. É fácil se rogar “evoluído” quando você tem o poder de desarmar seu inimigo.

De qualquer forma, é um ótimo episódio e um dos que melhor traduz o espírito da ficção-científica startrekiana. 

Episódio 27: The Alternative Factor (ou em português, O fator alternativo)

3/5

Escrito por Don Ingalls e dirigido por Gerd Oswad, trata-se do primeiro episódio de Star Trek a lidar mais especificamente com o tema do universo paralelo.

Neste episódio a U.S.S. Enterprise é abalada por um pulso de energia ao se aproximar de um planeta desconhecido.

Os sensores da nave localizam uma presença humana no planeta que não existia antes.  

Spock e Kirk vão até o planeta e encontram uma espaçonave de um homem só. 

Um homem desgrenhado chamado Lazarus, aparentemente dono da nave, aparece e escorrega de um penhasco e fica inconsciente. 

Kirk o transporta para a Enterprise para exames médicos.

O tenente Masters informa ao capitão Kirk que a misteriosa perturbação drenou os cristais de dilito na unidade de dobra e Lazarus periodicamente entra e sai do universo, encontrando um inimigo semelhante em um “corredor dimensional”, criando uma piscadela de energia. 

Spock relata um “rasgo” no espaço e no tempo do planeta. Lazarus diz que seu inimigo, tentando destruir o universo, está causando o fenômeno e exige cristais de dilítio para consertar sua nave e continuar a lutar contra seu inimigo que, posteriormente é revelado ser ele mesmo em uma outra dimensão.

Esse instigante episódio tem uma temática muito próxima de outro episódio da série: The Enemy Within, que também trabalha a questão do duplo, do gêmeo-mal ou doppelgänger. 

Lazarus está dividido em 2 partes, tal como Dr. Jekyll e Mr. Hyde, onde uma parte (positiva, jekylliana) representa a matéria e a outra (hydeiana, negativa) representa a antimatéria.

Episódio 28: The City on the Edge of Forever (ou em português, A Cidade a Beira da Eternidade)

5/5

Talvez, o mais famoso episódio de Star Trek da primeira temporada. Sua concepção é um fruto da mente de diversos escritores, incluindo Harlan Ellison, Steven W. Carabatsos, D. C. Fontana, Gene L. Coon e Gene Roddenberry. A direção ficou por conta de Joseph Pevney.

O episódio recebeu aclamação da crítica generalizada e tem sido frequentemente considerado o melhor episódio de toda a franquia, sendo recebido com carinho pelo elenco, equipe técnica e críticos. 

Elementos como o final trágico foram destacados por vários revisores. Recebeu vários prêmios, incluindo o Prêmio do Writers Guild of America de Melhor Drama Episódico na Televisão e o Prêmio Hugo de Melhor Apresentação Dramática.

Neste episódio a U.S.S. Enterprise está orbitando um planeta inexplorado. O médico-chefe Leonard McCoy está tratando o tenente Sulu quando a nave é atingida por uma distorção do tempo e McCoy acidentalmente se injeta com uma perigosa dose de cordrazina. 

Delirante e paranóico, McCoy foge da ponte para a sala de transporte, transportando-se para o planeta abaixo. O capitão James T. Kirk lidera um grupo de desembarque para procurar McCoy, e eles se deparam com um antigo arco de pedras brilhantes, que acaba sendo a causa das distorções do tempo. 

Eles descobrem que o arco é um ser consciente e se chama “Guardião do Eterno”.

O Guardião explica que é tem a capacidade de criar portais para qualquer tempo e lugar e mostra ao grupo imagens históricas da Terra.

Enquanto Spock grava imagens históricas do portal, McCoy escapa por ele. O grupo de desembarque repentinamente perde contato com a Enterprise, e o Guardião os informa que McCoy alterou o passado e que a Enterprise e tudo o que eles sabiam se foram.

O Guardião permite que Kirk e Spock sigam McCoy em um esforço para consertar a linha do tempo. 

O episódio apresenta a mesma problemática bradburyana do paradoxo temporal do episódio Tomorrow is Yesterday.

No entanto, esse episódio apresenta pontuações extremamente mais dramáticas e consequências brutalmente trágicas ao apresentar uma mulher chamada Edith Keeler – uma mulher do passado que dirige a 21st Street Mission, em uma Nova York na Grande Depressão da década de 30 (onde eles deveriam buscar McCoy). 

Edith Keeler é uma mulher fascinante, inteligente e curiosa, que cativa o capitão Kirk e o faz se apaixonar.

Eles descobrem que essa mulher, num futuro próximo, deveria morrer num acidente de carro e que eles não poderiam impedir isso, para que o curso da história não seja maculado e que eles possam voltar ao seu tempo normal sem que nenhuma alteração na história seja feita. 

Todo o drama de Kirk como uma liderança de uma grande frota estelar, responsável por decisões de vida e morte (e que também foi explorado no excelente episódio The Conscience of the King), é bastante sentido aqui.

Este episódio é uma verdadeira obra de arte da televisão e merece toda a sua reputação.

Episódio 29: Operation -- Annihilate! (ou em português, Operação Aniquilar)

3/5

Escrito por Stephen W. Carabatsos e dirigido por Herschel Daugherty, trata-se do último episódio da primeira temporada da série clássica de Star Trek. 

No episódio, a tripulação da Enterprise deve encontrar uma maneira de exterminar parasitas que alteram o comportamento que assumiram os corpos de residentes de uma colônia da Federação.

Depois do espetacular episódio anterior, The City on the Edge of Forever, temos um episódio competente que ficou popular por revelar novos fatos sobre a fisiologia vulcana.