Chronicle (ou Poder sem Limites em português) é um filme americano de 2012, dirigido por Josh Trank e escrito por Max Landis, com base em uma história coescrita por ambos.
A trama de Chronicle segue três estudantes do último ano do ensino médio em Seattle — Andrew, Matt e Steve — que, após descobrirem um objeto misterioso, adquirem poderes telecinéticos. Inicialmente, eles utilizam essas habilidades para se divertir e explorar novos limites, mas, à medida que a amizade entre eles se aprofunda, Andrew começa a sucumbir a impulsos sombrios e a uma crescente sede de poder. À medida que suas ações se tornam cada vez mais imprevisíveis e perigosas, a linha entre o bem e o mal se torna turva, forçando os amigos a confrontar suas próprias escolhas e as consequências que delas advêm.
O filme mistura elementos de suspense e ficção científica, explorando temas de poder, moralidade e as armadilhas da ambição.
Fiquei curioso com a escolha do diretor de adotar o estilo de found footage. Esse recurso estilístico geralmente tem uma conexão direta com a narrativa, e eu estava ansioso para descobrir seu papel no filme.
Como assisti ao filme sem saber nada sobre ele (nem mesmo li a sinopse), a cada nova reviravolta eu me questionava sobre o tipo de filme que estava vendo.
Ao longo do filme, minha opinião alternou entre aspectos positivos e negativos.
O primeiro ato chamou minha atenção ao apresentar os personagens com camadas de complexidade interessantes, especialmente Andrew, que enfrenta o problema de uma mãe doente e um pai alcoólatra e violento. O segundo ato quase me perdeu, tornando-se um pouco bobo, quase como uma comédia adolescente estranha. Apesar disso, essa fase é essencial para contrastar com o terceiro ato, que é espetacular e fez o filme me conquistar novamente.
No terceiro ato, os subtextos sombrios e filosóficos, que estavam sendo parcialmente desenvolvidos nos atos anteriores, se tornam mais evidentes.
Embora o filme mencione Schopenhauer, acredito que a filosofia de Nietzsche exerce uma influência mais significativa na narrativa.
Andrew, o personagem principal, a partir de determinado momento do filme, passa a se ver como uma figura superior, para além do bem e do mal, justificando suas ações com uma ética darwinista — no qual ele se assume como “apex predator” (superpredador).
O fato de o protagonista ter sido sempre mostrado como vítima (ou seja, presa) gera uma empatia convincente do público, enquanto seu perfil nietzschiano emerge como um contraponto fixado no extremo oposto de tudo que vimos até então, refletindo uma autoimagem negativa distorcida pela vontade de poder.
A complexidade do personagem é notável: quanto mais ele se sente fraco e impotente diante dos problemas reais da vida, mais se convence de que deveria usar seus poderes psíquicos para seu próprio benefício ou para aquilo que ele acha ser um “senso de justiça” (como um chamado vocacional divino).
Se ele possui poder e os outros não, por que não usá-lo? Por que não assumir sua posição de superioridade? Por que não se assumir como “apex predator”?
Achei isso excelente, pois esse delírio descreve perfeitamente uma fantasia de poder nietzschiana que, muitas vezes, se alinha com figuras que, sem poder real, fantasiam sua posse de forma perversa e até lasciva. Não é surpreendente que o fim de Nietzsche tenha sido o patético quadro de um homem chorando e abraçando um cavalo em crise de exaustão mental.
Embora alguns possam contestar isso como ad hominem, nada me tira da cabeça que isso reflete o grande paradoxo de Nietzsche, observado por Chesterton, traduzido na maldição de ser um homem fraco que idolatrava a força.
Na minha opinião, o nietzschianismo é, na verdade, a verdadeira moral do escravo e do ressentido, não o Cristianismo.
Chronicle ilustra bem essa ideia — embora não se aprofunde nesses termos específicos.
Além das questões filosóficas, o filme é bastante divertido. Adorei os efeitos especiais e o engajamento dos atores. As cenas finais são excelentes, com várias referências explícitas a Akira de Katsuhiro Otomo.
A escolha do formato found footage também se mostra acertada, pois a estranheza dos eventos no filme combina com a sugestão de realidade crua que o estilo oferece, criando uma sensação de verossimilhança estranha e vertiginosa.
Enfim, é um filme espetacular.