Uma coisa que sempre notei em mim é que sempre gostei de ficções científicas mais contemplativas.

Aliás, sempre acreditei que as ficções científicas foram muito mal interpretadas, pois o cerne da maioria das grandes histórias não está especificamente na “ciência” ou na “tecnologia”, mas sim nas antigas e recorrentes especulações da filosofia, dos mitos e da religião.

Sou naturalmente atraído pelas especulações dos escritores sobre o futuro, pois é da sua imaginação que podemos especular o que, na opinião deles, será transcendental.
Autores como Arthur C. Clarke, Philip K. Dick, Stanislaw Lem e Isaac Asimov trabalham com muito mais frequência temas como “memória”, “identidade”, “origem” e “finitude” do que “exploração espacial”, “robótica” ou “inteligência artificial”.

Quando terminei de assistir Ad Astra, influenciado por uma crítica muito boa que vi no perfil do Gyordano Montenegro Brasilino, fiquei completamente satisfeito pelo ritmo lento e pela abordagem introspectiva da história.

Ad Astra, antes de ser uma ficção científica, é um drama introspectivo.

Conseguir ser introspectivo dentro de uma história que envolve viagens interplanetárias é quase um paradoxo chestertoniano.

As próprias composições cinematográficas deste filme sugerem esse paradoxo. O filme tem duas principais composições: uma “hiperpanorâmica”, onde o invivíduo é completamente “miniaturalizado” em relação ao espaço, e “hipercloses”, que, no sentido contrário, tenta trazer realçar as emoções do personagem. Existe aqui tanto a vertigem da aproximação quanto do afastamento.

Ad Astra se passa num futuro próximo, onde a humanidade conquistou o espaço interestelar e estabeleceu bases em Marte e na Lua.
A história começa na Terra, onde o protagonista, Roy McBride, um astronauta renomado interpretado por Brad Pitt, é convocado para uma missão especial.

Ele é chamado para uma missão urgente para investigar estranhas interferências eletromagnéticas que estão ameaçando a sobrevivência do sistema solar. Essas interferências são acreditadas como sendo causadas por seu pai, o lendário astronauta Clifford McBride (Tommy Lee Jones), que foi dado como desaparecido há mais de 20 anos, enquanto liderava uma missão para o planeta Netuno, em busca de vida extraterrestre.

Clifford McBride não é o protagonista, mas certamente é o personagem principal.
Sua missão de encontrar vida fora da Terra se tornou uma obsessão comparável à do Capitão Ahab em encontrar Moby Dick. Ele abandonou a família, os filhos e até se tornou uma espécie de tirano para cumprir sua missão.

O título “Ad Astra” é derivado da frase em latim “per aspera ad astra”, que significa “por caminhos difíceis até as estrelas”, e tem origem na Eneida de Virgílio.
As estrelas sempre foram muito mais do que “esferas de plasma superaquecido”, elas são símbolos zodiacais. Elas guiam caminhos, essa é uma verdade que percorre desde os antigos navegadores (que contemplavam o Cruzeiro do Sul, Órion e a Estrela Polar para orientar suas navegações) até os Reis Magos no deserto, que seguiram uma estrela até o sagrado presépio do nascimento de Cristo.

Ad astra é sobre o antigo costume de seguir estrelas. Clifford McBride segue a sua estrela, sua obsessão de descobrir vida fora da Terra. Roy McBride também segue a sua estrela, que é seu pai.

Quando eu disse que Clifford McBride é o personagem principal é porque ele movimenta toda essa configuração temática. Sua obsessão de querer encontrar “vida fora da Terra” não é nada mais nada menos do que a antiga obsessão religiosa de encontrar “vida além da vida”. A velha pulsão pela Eternidade que, fora do ambiente da sabedoria religiosa, se torna enlouquecedora.

Enfim, Ad Astra é mais do que um bom filme pra mim, ele é tudo aquilo que sempre sobreviveu na ficção-científica, até mesmo entre os autores mais ateus: a religião

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