Para quem conhece David Cronenberg pelo body-horror ou pelo viés artístico mais conceitual, pode estranhar Senhores do Crime como um filme atípico de sua carreira – e de fato é.

Trata-se de um filme de máfia dirigido com todos os tropos típicos desse tipo de filme, cheio de tensões, senso de urgência, violência (aliás, muita violência) e charme. Ao mesmo tempo, é um filme com uma estrutura clássica, tanto na construção de personagens (todos eles identificáveis, com motivações claras e com arco de desenvolvimento – sendo um deles com um clássico arco de redenção) quanto na própria forma (narrativa linear com estrutura em três atos).

No entanto, é um filme enganosamente genérico.

O filme começa em Londres, onde a parteira Anna (Naomi Watts) encontra um diário em russo entre os pertences de uma jovem grávida que morre ao dar à luz. Determinada a descobrir a origem da recém-nascida, Anna recorre ao seu tio Stepan (Jerzy Skolimowski) para traduzir o diário, que revela ligações sombrias da jovem com a máfia russa. Sua busca a leva até Nikolai (Viggo Mortensen), um motorista misterioso e violento que trabalha para o chefe do crime Semyon (Armin Mueller-Stahl). Envolvendo-se em um mundo de violência extrema, Anna tenta, ao mesmo tempo, sobreviver e completar sua missão.

Para esse filme, foi feito um prolongado estudo dos gângsteres russos. Gilly McKenzie (especialista em crime organizado da ONU) fez um trabalho de consultoria para a equipe do filme. A máfia russa, assim como muitas outras organizações criminosas ao redor do mundo, utiliza-se de tatuagens como distintivo simbólico. Dependendo dos desenhos, elas podem indicar hierarquia, especialidade, afiliações étnicas ou geográficas – basicamente, elas são seu cartão de visitas.

Todos os ritos iniciáticos, tatuagens e detalhes do filme foram meticulosamente pensados em prol da plausibilidade.

Um filme que revela uma inteligência formal admirável, uma formalidade que não vem de uma incapacidade criativa, mas é necessária para dar nitidez àquilo que o diretor quer mostrar: uma história de heroísmo e redenção (podem achar clichê, eu acho lindo) dentro de um contexto de extravagância, sujeira, crueldade e violência extrema. Era necessário um trabalho realista pronunciado em prol de verossimilhança. Era necessário pesquisa, era necessário que Cronenberg diminuísse para a história crescer – e saber fazer isso é admirável.

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