Poucas coisas são mais específicas do que o filme O Funeral das Rosas, dirigido e escrito por Toshio Matsumoto em 1969. Trata-se de um filme de terror japonês, vagamente adaptado de Édipo Rei, ambientado na cultura gay underground de Tóquio nos anos 60 e com uma jovem mulher transgênero como protagonista.
O filme é um exemplo da Nouvelle Vague japonesa e combina elementos de cinema de arte, documentário e experimental. Acredita-se que tenha influenciado Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick.
Como mencionei, o filme gira em torno da cena gay underground em Tóquio. O enredo é fragmentado e salta continuamente entre eventos em uma linha do tempo não linear. No entanto, ao contrário de muitos filmes que usam essa abordagem, achei este particularmente fácil de entender.
O filme também inclui cenas filmadas em estilo documentário, nas quais os membros do elenco são entrevistados sobre sua sexualidade (quase todos os atores do filme são gays). Notei que, além da consciência cristalina sobre a sexualidade como algo inerente (a maioria afirma que sempre foi gay, e não uma escolha), há uma certa ausência de reivindicações específicas em relação à sociedade. Os entrevistados mencionam que o mundo não precisa aceitá-los, e os preconceitos da sociedade japonesa parecem ser vistos como uma consequência natural da sua condição.
Outra coisa aque notei é a indiferença em relação a ideia de serem aceitos ou não. Não sei se isso é uma característica oriental ou típica da comunidade gay dos anos 60, mas eles me pareceram mais “durões” e resilientes do que hoje em dia.
Não sei se isso é uma característica oriental ou típica da comunidade gay dos anos 60, mas eles me pareceram mais “durões” e resilientes do que hoje em dia.
Ou pode ser impresão minha, pois, até então, a única referência gay oriental mais ou menos dessa época que eu conheço é Yukio Mishima, um sujeito que se suicidou em protesto à rendição do Japão na Segunda Guerra Mundial.
O filme explora diversos contextos traumáticos, como abuso infantil, abandono parental, uso de drogas e assassinatos. No entanto, também há momentos cômicos, pontuados por uma trilha sonora mais animada, como a cena de transexuais usando o mictório de um banheiro masculino e uma briga de rua entre gangues de prostitutas e transexuais, com xingamentos politicamente incorretos de ambos os lados. As prostitutas, especialistas em transfobia, e os transexuais, afiados no machismo, uma obra-prima.
Embora seja classificado como um filme de terror, ele incorpora tropos típicos do gênero de terror psicológico e faz acenos para um horror de possessão.
Enfim, para quem busca algo realmente único, fica a dica.
Trilha sonora recomendada: Painkiller (Judas Priest).
Obs: Eu assisti a este filme apenas uma vez, e tudo o que escrevi é baseado em minhas impressões iniciais. Não tome esta opinião como definitiva, pois costumo formar uma opinião mais precisa sobre filmes e música após assistir (ou ouvir) uma segunda ou terceira vez.