“A Field in England” é um filme de terror dirigido por Ben Wheatley, que abrange pelo menos três subgêneros ou subestilos: folclórico, psicológico, histórico e experimental.
A história se passa durante a Guerra Civil Inglesa, e acompanhamos a fuga de um alquimista chamado Whitehead, que está sendo perseguido pelo comandante Trower.
Whitehead é salvo por um soldado chamado Cutler, que estava nas imediações enquanto ele fugia do comandante. No caminho, Whitehead conhece dois desertores: Jacob e Friend. Os quatro deixam o campo de batalha em busca de uma cervejaria que Cutler afirma estar próxima.
Cutler leva todos para um campo de cogumelos, onde ele cozinha uma refeição e encoraja todos a comerem. No entanto, Whitehead, que além de alquimista é um cristão devoto, estava em fase de jejum.
A partir deste ponto, a trama se desenrola em múltiplas dimensões, sendo passível de análise em pelo menos três campos de interpretação: surrealista, simbólico e psicanalítico. Todos os personagens e situações parecem se tornar alegorias arcanas de algum tratado obscuro do ocultismo inglês renascentista.
Após a refeição, eles avistam um poste de madeira com uma corda enrolada. Eles puxam a corda e, com muito esforço, desenterram um corpo do chão, que seria o de um mago irlandês chamado O’Neill.
O’Neill é um alquimista rival para quem Cutler trabalha e que roubou documentos do mestre de Whitehead.
O’Neill, inicialmente prisioneiro, rapidamente assume autoridade sobre o grupo e conta a eles sobre um tesouro escondido em algum lugar do campo.
O grupo vai para o acampamento de O’Neill, onde ele tortura Whitehead para usá-lo como uma “vara divinatória humana”.
Depois de usar Whitehead para localizar o tesouro, que está próximo ao acampamento, O’Neill ordena que Jacob e Friend cavem enquanto ele vai dormir em uma barraca.
Jacob sucumbe à influência dos cogumelos alucinógenos e, após várias horas de escavação, ataca Friend.
Cutler ri e urina neles. Quando Jacob tenta atacá-lo, Cutler acidentalmente atira em Friend.
Whitehead não consegue salvá-lo, e Friend morre.
Cutler é forçado a terminar de cavar sozinho, enquanto Jacob se deita na vegetação rasteira e Whitehead coloca o cadáver de Friend em um matagal.
Cutler se aproxima do tesouro, atraindo a atenção de O’Neill, que descobre que Jacob e Whitehead partiram.
Chegando onde está o cadáver de Friend, O’Neill persegue Whitehead, que ingere cogumelos em grande quantidade, aumentando sua consciência, mas sofrendo uma experiência alucinatória, onde conjura um vento violento para soprar a tenda do acampamento.
Cutler descobre que o “tesouro” é apenas uma caveira, e Jacob volta para se juntar a Whitehead na fuga de O’Neill.
Cutler repreende O’Neill com raiva, culpando-o por confiar em Whitehead e mentir sobre a cervejaria. O’Neill prontamente mata Cutler e então persegue Whitehead e Jacob, que revistam as armas de Cutler e retornam ao acampamento destruído.
Enquanto se preparam para um ataque, Friend aparece vivo e revela a localização deles para O’Neill.
Quando Jacob joga Friend no chão para detê-lo, O’Neill atira em Jacob no estômago, mas Jacob devolve o fogo, quebrando a perna de O’Neill.
Jacob morre devido aos ferimentos, após supor que o tesouro era a amizade que compartilhavam.
Friend empunha a lança de Cutler e ataca O’Neill, mas O’Neill o mata com seu último tiro.
Whitehead aproveita a situação para finalmente matar O’Neill com um tiro na nuca.
Whitehead enterra os cadáveres de seus amigos no buraco e deixa o campo.
Vestindo as roupas de O’Neill, ele reúne os documentos roubados de seu mestre e retorna ao lugar onde conheceu Cutler, Jacob e Friend, de onde os sons da batalha estão surgindo.
Após atravessar a cerca viva, ele vê Friend, Jacob e ele mesmo parados juntos.
O filme pode ser visto como uma alegoria do “processo alquímico”, que transforma homens em loucos em uma situação extrema (aqui representado pela perseguição, guerra, política e conspiração). Por isso mesmo, ele possui duas (ou mais) vias de interpretação que não parecem ser excludentes, mas complementares: a via esotérica e mística como complementação da via histórica, assim como a via psicodélica (dos cogumelos alucinógenos) como complementação da via esotérica e mística.
O filme é tão complexo quanto o próprio ser humano: um ser refém de sugestões mágicas, mentais, folclóricas, religiosas, políticas, psicológicas, simbólicas, históricas, culturais, espirituais e, além de tudo, lisérgicas.
O que Ben Wheatley faz é reunir e condensar toda essa zona de influência em cinco personagens, que se tornam vetores arquetípicos de múltiplos significados.
O filme pode também representar o amadurecimento espiritual de Whitehead através de sucessivas provações.
No início do filme, ele é um “homúnculo” (símbolo recorrente do ocultismo), pois está apenas fugindo e se escondendo. Ou seja, ele é um estudioso da alquimia que nunca saiu da biblioteca – nunca teve coragem de encarar a vida fora dos livros.
No final do filme, ele se torna uma figura poderosa, com ofício mágico refinado, sendo capaz até mesmo de controlar os ventos.
Após todas as provações e fugas covardes, ele enfrenta e derrota seu inimigo, vestindo as roupas como despojo de guerra e caminhando em direção ao lugar do qual estava fugindo.
Tudo isso evidencia, obviamente, uma dimensão metafórica.
Enfim, “A Field in England” é um filme que pode parecer confuso, mas é um prato cheio para quem gosta do exercício de decifrar símbolos.
Aliás, no cinema, o gênero do horror é, para mim, de longe o que abre as melhores e mais interessantes vias para o refinamento simbólico, esotérico, religioso e psicológico.
Certamente é um filme que revisitarei mais vezes.