Um Domingo Maravilhoso (Subarashiki Nichiyōbi) é um filme japonês de 1947 co-escrito e dirigido por Akira Kurosawa.
Trata-se de um shomin-geki, um subgênero do cinema japonês que é focado no drama de pessoas comuns.
O filme foi feito durante a ocupação do Japão logo após ao final da Segunda Guerra Mundial.
Assim como muitos filmes japoneses dessa época, ele também acaba se transformando num registro da calamidade e da destruição do país. Destruição essa que não apenas se resume a baixas militares, mas que se espalha nas áreas civis, onde as ruínas e as crises se misturam ao quotidiano de pessoas comuns, que não tem nada a ver com as tensões geopolíticas criadas pelos paises.
O filme é um dos muitos dessa época que se assemelham aos filmes do movimento neorrealista italiano, enfatizando no seu pano de fundo a pobreza, a fome, o enfraquecimento dos costumes sociais e a dilapidação urbana do pós-guerra.
Em Um Domingo Maravilhoso acompanhamos o casal Yuzo (Isao Numazaki) e Masako (Chieko Nakakita).
Ambos moram separados e longe um do outro pois são incapazes de pagar um lugar próprio.
Assim como em muitos filmes do diretor, vemos que Akira Kurosawa faz um recorte socio-econômico bem específico. Estamos prestes a testemunhar um drama amoroso de pessoas comuns e de baixa-renda.
Masako mora com 15 parentes em um apartamento de quatro quartos e Yuzo, seu marido, mora com um amigo em um pequeno estúdio.
Diante dessa situação, a vida do casal está reduzida a encontros e passeios dominicais em lugares públicos (e de preferência gratuitos).
Um Domingo Maravilhoso se passa em um destes domingos.
O título tem uma ironia. O domingo do filme não parece necessariamente um”dia maravilhoso”. Trata-se de um dia úmido e frio para o qual nenhum dos dois está agasalhado o suficiente.
Eles tem apenas 35 ienes para aproveitar o dia todo.
Eles visitam um imóvel a venda (fingindo entre si que um dia vão comprá-lo), jogam beisebol com um grupo de crianças de rua, vão ao zoológico, tentam e não conseguem comprar ingressos baratos para um concerto sinfônico, tomam chá e fazem um passeio no parque.
Resumindo: um dia marcado por frustrações e algumas alegrias pontuais.
O que eu gosto neste tipo de filme é que a pretensão dos seus protagonistas são bem singelas. Eles não querem resolver grandes problemas existênciais, nem querem salvar o mundo – eles só querem aproveitar uma tarde de domingo.
Essa simplicidade da história acaba enfatizando temas que são ao mesmo tempo macro e subliminares como, por exemplo, a papuerização, a desigualdade, a destruição e ocupação de um país envolvido numa grande guerra.
As paisagens pelas quais eles passeiam estão marcadas por ruínas incendiadas e cartazes publicitários – uma combinação que reflete metaforicamente muito bem a situação geopolítica que eles estão mergulhados: a vida num Japão destruído e ocupado pelas forças militares americanas.
No entanto, esse não é o foco do filme. O foco do filme é a sobrevivência. Como essas pessoas conseguem suportar a pobreza e a destruição. Como elas conseguem sobreviver?
Akira Kurosawa dá uma resposta que é, muitas vezes, vista como ingênua e insuficiente: o amor ao próximo e o sonho.
Mesmo diante das dificuldades, vemos que cada um luta para manter o moral do outro, e essa é uma das coisas mais bonitas do filme.
Quando eu gosto muito de um filme, sempre me bate uma ansiedade de escrever sobre ele pois acredito que nunca vou conseguir detalhar tudo aquilo que eu gostaria de apresentar.
Para quem está lendo essa crítica, tenha em mente que a considero apenas um rascunho e que provavelmente irei mencionar outras vezes esse filme ao longo da vida.
Tenho certeza que as memórias desse filme vão me acompanhar pra sempre.
Este é, provavelmente, um dos filmes mais melancólicos e bonitos que já vi na vida.
Primeiro, Akira Kurosawa faz um recorte de um Japão que pouco se vê no cinema: um país repleto de pessoas falidas, órfãos e andarilhos. Um país onde a crise econômica e a crise de identidade nacional são igualmente severas.
No entanto, para além das mazelas sociais expostas no filme, Um Domingo Maravilhoso acaba se tornando um filme sobre sonhos e esperança de um futuro melhor.
Não se trata de um filme meramente escapista, muito pelo contrário. O filme desloca o olhar social profundo para meditar sobre o sonho. O sonho, no filme, éum ato de bravura impertinente de enfrentar a realidade, não de fugir dela.
Vou além, sonhar nesse mundo se torna mais que um ato de coragem, mas uma necessidade vital – uma ferramenta para suportar os “ventos frios” desse mundo.
São vários momentos do filme de singular beleza, desde as composições cênicas criadas pelo diretor (como a belíssima cena do casal brincando num balanço ao luar) quanto a poderosa cena onde a personagem Masako simplesmente quebra a quarta parede e implora para que o público aplauda uma performance imaginária que Yuzo fez da Sinfonia Inacabada de Schubert, quando os dois brincavam em um anfiteatro vazio.
Veja a cena abaixo:
Enfim, Um Domingo Maravilhoso é um dos melhores exemplos de filme que consegue ser político sem ser panfletário e que consegue ser lúdico sem ser ingênuo, piegas ou escapista. Um equilíbrio perfeito e extremamente difícil de encontrar (até mesmo entre os mestres, como Akira Kurosawa – que, não raro, as vezes exagera muito no seu sentimentalismo).