Quando uma obra de arte é apresentada ao mundo, temos basicamente uma miríade de possibilidades de interagir com ela. Podemos enxergar nessa obra os subtextos ocultos e soterrados em sua forma. Identificamos, por exemplo, contexto histórico e político, comentários sociais, sinalizações biográficas, metáforas, entre outros símbolos. Como uma obra de arte é necessariamente também uma manifestação material, ela também se apresenta no campo estético, no qual as impressões e sentimentos se tornam o primeiro e mais importante impacto.

Em suma, a experiência de consumir uma obra de arte é uma mistura de intelecções etéreas, percepções simbólicas e sensibilidade.

Geralmente, quem apenas consome uma obra considerando apenas o filtro da sensibilidade, a estética pura, é rechaçado como parte de um público não sofisticado – e as próprias obras que se apresentam dessa forma são ignoradas como obras menores. Não é por acaso que filmes de terror são desprezados pela academia, onde o apelo estético e a experiência sensorial (no caso, do medo) são mais acentuados que o normal – na minha opinião, um puro preconceito intelectualóide infundado.

O mesmo acontece com filmes de ação, nos quais a experiência de adrenalina é negligenciada nas análises e considerações mais significativas, pois, aparentemente, apenas atendem a um anseio escapista acrítico da sua audiência.

No entanto, na minha opinião, o exagero e o apego a intelecções etéreas, percepções simbólicas e, principalmente, os exaustivos “comentários políticos”, podem refletir uma mediocridade intelectual tão acentuada quanto aquela de quem consome um produto apenas pelo que ele pode oferecer de distração. Neste caso, diferente da maioria dos jornalistas, não acho que quem consome Bacurau (por exemplo) é intelectualmente superior a quem consome qualquer produto enlatado da Marvel (para falar a verdade, acho até o contrário).

Dentro dessas discussões, existem filmes como Old Boy.

Old Boy é um filme sul-coreano de 2003 dirigido por Park Chan-Wook, baseado em um mangá japonês de mesmo nome.

O filme faz parte do que ficou conhecido como “Trilogia da Vingança”, que, além deste filme, inclui Mr. Vingança (lançado em 2002) e Vingança Planejada (de 2005).

Aqui, acompanhamos a história de Oh Dae-su, que fica trancado num quarto de hotel por 15 anos sem saber o motivo. Quando é libertado, Dae-su se vê preso numa espécie de jogo sádico comandado por uma figura enigmática e perigosa chamada Lee Woo-jin.

O filme é tão aflitivo quanto estiloso e, parte de sua projeção simbólica, apesar de escandalizar senhorinhas puritanas, é completamente fundamentada em nossa tradição.

Histórias de vingança, violência extrema e incesto não são incomuns nem na Bíblia Sagrada (especialmente no Velho Testamento) nem na mitologia greco-romana, dois dos nossos pilares fundamentais.

No entanto, não acho que a pretensão de Old Boy seja realmente atingir essa projeção simbólica de forma consciente. Old Boy é um cinema extremamente sofisticado e puramente sustentado nas manipulações sensoriais mais viscerais – e não há nada de errado isso. O controle de ritmo e a manipulação da trilha sonora suplantam uma história de vingança que é, ao mesmo tempo, muito inverossímil e muito bem contada. Tudo neste filme visa causar um efeito imediato e traumático na audiência, tal como as marteladas que o protagonista desfere em seus oponentes.

Em suma, um filmaço

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