A sociedade indo-europeia era dividida em três classes: sacerdotes, guerreiros e agricultores. A identidade religiosa era trifuncional: tínhamos a função da soberania mágica e jurídica, a função da força guerreira e, finalmente, as divindades da fecundidade e da prosperidade econômica.
Os celtas repartiam a sociedade em druidas (sacerdotes, juristas), aristocracia militar (flait, literalmente “poder”, equivalente ao sânscrito “ksatra”) e homens livres (airig), possuidores de vacas (bó). A sociedade romana também seguia o mesmo modelo na ideia geral de uma organização trina, onde o mundo terreno era uma cópia da tríade capitolina celeste composta por Júpiter (cosmocrata jurídico), Marte (deus da guerra) e Quirino (deus das riquezas da terra). Entre os escandinavos, a mesma coisa: temos Odin, Thor e Freyr.
Por isso, a prova iniciatória por excelência consistia no combate do jovem guerreiro contra três adversários ou algum monstro tricéfalo. Não se deve entender “combate” como um sinal de oposição e animosidade, mas como a dominação simbólica de algo. As histórias míticas, desde sempre, nunca são o que literalmente parecem nos contar. Temos, por exemplo, o combate entre Cuchulainn contra os três irmãos, ou Horácio contra os três Curiácios, ou no mito de Indra e do herói iraniano Thraetaona, que matam, cada qual, um monstro de três cabeças.
O iniciado deve dominar a riqueza (primeira cabeça), o corpo (segunda cabeça, relacionada à guerra) e a mente (terceira cabeça, relacionada ao entendimento das coisas).
Existe um motivo para entendermos o mundo tradicional organizar o espírito guerreiro na subordinação da segunda grandeza. A violência é o exercício material de poder e, como tal, se manifesta num aspecto de perturbação da ordem.
Não sou muito “evoliano”, mas se tem uma coisa que Evola percebeu muito bem é que o poder real na perspectiva da tradição é aquele fundamentado na “não-ação”. A decepção de Evola com o fascismo se deu, principalmente, quando ele percebeu neste movimento uma paródia cômica do tradicionalismo assentada principalmente na violência e no populismo.
Militarização também é decadência.
Para Mircea Eliade, o motivo dos indianos considerarem Mitra como o deus soberano em vez de Varuna é o seu aspecto “meditativo, claro, organizado, benévolo e sacerdotal”.
A sociedade que perde a noção de que a paz é preferível à guerra, que a não-agressão é preferível à violência, não pode ser considerada uma sociedade tradicional. O espírito moderno se manifesta em todos aqueles que juram rejeitá-lo.