Berserk e a Tragédia

Berserk é um mangá (que se tornou uma série animada, disponível na Netflix) que mescla fantasia, ação, terror e aventura.

Sua história é contextualizada numa idade média mítica (no reino de Midland), repleta de monstros e feiticeiros.

O protagonista é Guts, um ex-mercenário amaldiçoado e condenado a vagar em busca de vingança.

A trama permeia temas como traição, autopreservação, liberdade e a questão da natureza da humanidade, se ela é boa ou má.

O que impressiona em Berserk é sua essência profundamente shakespeariana, mais do que eu imaginava.

Talvez seja uma das obras mais shakespearianas com as quais já tive contato.

Muitas pessoas comparam Berserk a Macbeth, mas eu vou além. Além de Macbeth, Berserk tem traços de Júlio César, Ricardo III e Rei Lear.

A história é uma mistura de tragédia elisabetana com tragédia grega edipiana, com alguns elementos sobrenaturais dantescos.

Da tragédia elisabetena, Berserk toma por empréstimo a ideia da obsessão do poder que se traduz num estado de calamidade geral (guerras, conspirações, traições, vinganças) e o heroísmo dos protagonistas, que é quase todo grifado por uma amoralidade fatídica que se alterna entre poucas glórias e muitas catástrofes.

Da tragédia grega edipiana, Bersek toma de empréstimo a ideia da rejeição do livre-arbítrio e a destruição do herói.

Assim como em Édipo Rei, todos os personagens em Berserk nascem com o destino traçado, e nada pode alterá-lo. Pelo contrário, quanto mais tentam fugir, mais se aproximam do destino final.

A destruição do herói em Berserk é semelhante à de Édipo Rei em sua essência: não é causada por traços negativos de caráter (que também existem) ou por um ato impiedoso, mas pela limitação inerente ao ser humano, surgindo de sua incapacidade de conhecer e controlar as variáveis que compõem seu destino.

Resumidamente, Guts (e também Griffith) pode ser invencível entre os homens, mas é completamente impotente e humilhado entre os deuses.

Em suma, sim, é uma obra de alta cultura.

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O podcast é apresentado por Gabriel Vince. Já foi estudante de filosofia, história, programação e jornalismo. Católico, latino e fã de Iron Maiden. Não dá pra ser mais aleatório que isso.

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