O Passageiro Habitual de Philip K. Dick

“O Passageiro Habitual” é um conto de ficção científica de Philip K. Dick que foi publicado pela primeira vez em 1953 na revista Amazing Stories.

A história começa quando um gerente de estação ferroviária encontra um viajante que deseja comprar passagens para “Macon Heights”, uma cidade que não pode ser encontrada em nenhum mapa convencional.

Quando questionado sobre a cidade, o viajante literalmente desaparece diante dos olhos do gerente.

Perplexo com o ocorrido e baseado nas informações extraídas do passageiro, o gerente da estação decide investigar pessoalmente sobre a cidade misteriosa e acaba embarcando no mesmo trem que o passageiro pretendia pegar para chegar à cidade.

O gerente da estação então se vê chegando a uma cidade real que, teoricamente, não deveria existir.

Uma investigação subsequente revela que a cidade Macon Heights quase existiu, mas foi eliminada por um pequeno voto durante uma reunião de planejamento.

“O Passageiro Habitual” é uma brincadeira baseada em extrapolações de hipóteses cosmológicas. Aqui, o excedente imaginativo de Philip K. Dick transborda em um pressuposto interessante: e se o passado pudesse ser alterado depois de já ter ocorrido?

Vale ressaltar que não estamos falando de “viagem no tempo”, mas sim de uma realidade quântica.

E se Macon Heights não existisse e existisse ao mesmo tempo?

Como seria a “existência de uma cidade que não existe”? Como seria sua própria história? Como seria sua própria cadeia de acontecimentos? Quem seriam seus habitantes? E, principalmente, como essa “cidade-não-cidade” se articularia com as cidades vizinhas?

O mais curioso em “O Passageiro Habitual” é que esses eventos não são paralelos, mas se entrelaçam na mesma realidade e dimensão.

O que diferencia a ficção científica de Philip K. Dick são as realidades instáveis. A realidade alternativa do “Passageiro Habitual” não opera em conflitos ou paralelismos, mas em uma sobreposição assíncrona que transcende as próprias regras da lógica conhecida.

Embora eu não seja um especialista no assunto, já me disseram que a única área da ciência que aborda seriamente a hipótese da coexistência simultânea de resultados possíveis é a física quântica.

No entanto, é importante considerar para onde Philip K. Dick está direcionando seu olhar. Sua intenção é meramente criar um conto quântico ou utilizar isso como um trampolim para discussões mais práticas e observáveis no dia a dia?

Não estaria Philip K. Dick discutindo e criticando o urbanismo acelerado e as realidades instáveis das cidades, que mudam continuamente de fisionomia e se tornam irreconhecíveis em um curto espaço de tempo?

Podemos viver em uma parte específica de uma grande metrópole e ignorar quase todo o resto de sua geografia. Podemos, sem querer, descobrir um novo bairro em nossa própria cidade, que pode ser tão estranho quanto chegar a uma cidade diferente; podemos ter a sensação estranha e conflituosa de que tudo é novo e, ao mesmo tempo, tudo sempre esteve lá.

Não estaria Philip K. Dick transformando em conto uma simples observação que ele teve enquanto andava de metrô na Califórnia?

Se essa hipótese for verdadeira, “O Passageiro Habitual” pode se tornar um dos meus contos favoritos. Afinal, qual foi a última vez que você olhou pela janela e pensou em algo tão inventivamente aventuresco e intrigante? Afinal, quando nos tornamos adultos, a cidade se torna algo meramente funcional – um mero espaço indiferente entre nossa casa e nosso trabalho.

Independentemente das intenções de Philip K. Dick, “O Passageiro Habitual”, mesmo não sendo um conto para crianças, reanimou em mim um adormecido lado infantil.

Episódio 9: The Commuter (Electric Dreams – Amazon)

⭐⭐⭐⭐⭐

A adaptação dirigida por Tom Harper e roteirizada por Jack Thorne é o que podemos chamar de uma adaptação respeitosa, delicada e expansiva.

Na versão da Amazon, Ed Jacobson (personagem principal) ainda é um ferroviário em uma estação de trem. No entanto, sua vida é mais dramática do que na versão original do conto. Seu filho, Sam, sofre de violentos surtos psicóticos.

Um dia, uma jovem chamada Linda pede uma passagem para um destino chamado “Macon Heights” e, ao descobrir que esse lugar não existe, desaparece diante dos seus olhos – como no conto original.

Intrigado, Jacobson segue vários passageiros que saltam do trem e caminham até uma vila idílica onde seus traumas são eliminados.

Ao voltar para casa, ele descobre que seu filho nunca existiu e retorna a Macon Heights para encontrar Linda e exigir que ela restaure sua vida original.

O problema do seu filho se torna um acréscimo relevante aqui.

A versão da Amazon aborda todas as questões do conto original e mergulha vertiginosamente na dualidade entre o que “existe” em contraponto ao que “deveria existir”.

Macon Heights é um lugar perfeito, mas ostensivamente ilusório. Isso se traduz visualmente em escadas que descem quando deveriam subir e em eventos – bons momentos que literalmente se repetem – como os recém-noivos entusiasmados correndo pelas ruas.

É uma descrição maravilhosa de uma mente nostálgica, que busca reviver os mesmos momentos exatos de felicidade – mas aterradora quando percebemos que são apenas construções ilusórias de uma fantasia escapista materializada.

Macon Heights (que representa aqui a própria vida em si) só é perfeita porque não é tocada pela realidade. Existe uma boa sugestão de ambiguidade neste episódio e uma boa discussão sobre o que é realmente felicidade.

Até agora, é o melhor episódio da série.

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