A Coisa-Pai – Philip K. Dick

 

A Coisa-Pai” é um conto escrito por Philip K. Dick em 1954.

Nesta narrativa, acompanhamos a história de uma típica família norte-americana, na qual o pai, numa noite de trabalho na garagem, é substituído por uma réplica alienígena diante dos olhos do filho.

A réplica, conhecida como a “coisa-pai“, é fisicamente idêntica à sua matriz e consegue entrar em casa sem ser notada.

A criança, apavorada e perplexa diante desse bizarro testemunho e das possíveis ações da “coisa-pai“, tenta recrutar outras crianças para ajudá-la a revelar a verdade para sua mãe, seu bairro e o mundo.

Estamos diante de uma premissa muito comum na ficção científica da época: o tema da “invasão de corpos”.

Esse conto deu origem ao clássico da ficção científica “Invasores de Corpos” (Invasion of the Body Snatchers) de 1956, filme que ainda hoje é citado em discussões sobre a relação entre geopolítica e produção cultural americana durante a Guerra Fria. Nesse período, havia uma certa predileção por produções que tratavam de temas como infiltrações, espionagens e sabotagens, explorando o medo das pessoas de perderem o controle de sua individualidade, transformando-se em marionetes de vontades alheias (e estrangeiras).

O medo de invasões alienígenas fazia um paralelo claro com o medo do comunismo.

Dado o contexto e o local em que foi escrito o conto, parece que lidamos com uma analogia óbvia para o pesadelo de uma ideologia estranha e perturbadora que toma conta de nossos vizinhos e entes queridos, destruindo tanto as relações familiares quanto o frágil tecido social de uma sociedade livre e saudável.

No entanto, não pense que “A Coisa-Pai” é um conto datado, apenas por se encaixar perfeitamente bem no contexto histórico e político. Ele sobrevive, pois trata de uma questão atemporal sobre identidade e percepção.

E se as pessoas não forem o que parecem ser? Como podemos saber realmente que a pessoa com quem estamos falando é a mesma que conhecemos? Além disso, podemos confiar em nossa própria percepção?

Quanto à última pergunta, seria interessante notar, no conto, a perspectiva da criança. Quem conduz a história é a própria criança, o que nos leva a questionar a veracidade dos fatos relatados, dado que as crianças tendem a fantasiar histórias absurdas e, muitas vezes, confundi-las organicamente com a realidade.

Os filhos testemunham seus pais em todos os tipos de humor, como se fossem pessoas diferentes usando a mesma pele.

Philip K. Dick lembrava-se bem desse medo de sua própria infância. Ele escreveu: “Sempre tive a impressão, quando era muito pequeno, de que meu pai era duas pessoas, uma boa, uma má.”

Enfim, “A Coisa-Pai” é um conto que se torna um denominador comum entre uma fantasia sombria infantil, uma ficção científica com metáforas geopolíticas e um relato biográfico de Philip K. Dick sobre o próprio pai.

Episódio 7: The Father Thing (Electric Dreams, Amazon)

⭐⭐

Dirigida e roteirizada por Michael Dinner, a versão da Amazon do conto “The Father Thing” à primeira vista seria tudo aquilo que uma adaptação poderia ser: seguindo ipsis litteris o conto e capturando o feeling da história.

O problema é que o conto tenta se adaptar aos dias atuais, e aqui notam-se certas inconsistências bastante evidentes. O garoto apenas utiliza um computador para se comunicar com os outros acerca das suspeitas de que seu pai é um alienígena dentro de seu quarto, ignorando completamente a possibilidade da comunicação via tecnologia móvel por meio de redes sociais.

A impressão é que o conto foi originalmente escrito para ser adaptado nos anos 80 e, numa decisão de última hora, foi reescrito para os dias atuais – sem os devidos reajustes.

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O podcast é apresentado por Gabriel Vince. Já foi estudante de filosofia, história, programação e jornalismo. Católico, latino e fã de Iron Maiden. Não dá pra ser mais aleatório que isso.

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