Segundo Mircea Eliade, a construção de uma casa é uma analogia à criação do mundo.
Para compreender isso, é necessário desmontar o conceito de casa em seus elementos mais básicos: chão, pilar e tenda (ou teto).
Em relação ao mundo, que era entendido como uma casa, o homem primitivo percebia o chão em que pisava e o céu que o cobria.
No entanto, faltava-lhe definir o pilar, que conectava o chão à tenda celeste. O sagrado é precisamente essa ligação, essa estrutura verticalizada que se estende do chão em direção ao céu e sustenta a tenda.
Por isso, há uma recorrência na representação do sagrado por meio de árvores.
O carvalho dos druidas, o Yggdrasil dos nórdicos, o Baobá dos africanos e, evidentemente, o lenho da Cruz.
Outra recorrência: ao pé de todas essas árvores, eram feitos sacrifícios.
Não sei exatamente o motivo, mas o sangue era necessário para renovar a aliança entre os deuses e a humanidade. .
O sangue era a seiva que nutriria esse acordo.
O Cristianismo compartilha com todas as religiões esse mesmo esquema. Temos o céu, o mundo e a cruz sagrada como o pilar da aliança que é nutrida pelo sacrifício.
No entanto, perceba que a Cruz é diferente e até oposta, pois o sacrifício não provém dos homens, mas de Deus. A seiva sagrada do sangue de Cristo não “sobe”, mas escorre pelo lenho da Cruz e se derrama no chão. Ou seja, não somos nós que renovamos a aliança com Deus, mas Ele mesmo que o faz conosco.
Isso ilustra a extrema dificuldade de enquadrar o Cristianismo com outras religiões e tradições.
O Cristianismo é a pedra no sapato do Perenialismo.
À primeira vista, é possível pensar no Cristianismo como apenas mais uma das inúmeras maneiras diferentes de entender o sagrado. Muitos perenialistas até tratam o Cristianismo com o máximo de respeito que conseguem.
No entanto, em uma análise mais profunda, o Cristianismo não apenas se diferencia de tudo, mas também subverte, diante de nossos olhos, todas as noções que acreditamos serem ortodoxas.
Por isso, acho Guénon interessante mas insuficiente.
Na foto: o poste kauwa-auwa dos nativos australianos. O eixo cósmico para eles.